Viúvas de empregados da RFFSA vivem com pensões insuficientes para bancar gastos de saúde. Apesar dos protestos, governo diz que questão está resolvida e não tem volta
Sandra Kiefer
Não só os aposentados e pensionistas da RFFSA estão sofrendo. Os poucos que restaram na ativa correm o risco de perder a complementação e o direito a receber o salário integral como estivesse na ativa, garantido em lei. Segundo denúncias de sindicatos, 512 pedidos de aposentadorias de ex-ferroviários da Rede estão engavetados no Ministério do Planejamento desde 2007, com a incorporação da empresa pelo Departamento de Extinção e Liquidação (Deliq).
“O chefe do departamento mandou que os comandos de complementação, pensão e aposentadoria não fossem mais emitidos, até segunda ordem. Isso já tem um ano”, afirma Paulino Moura, diretor do sindicato dos ferroviários da Bahia e Sergipe e diretor da Federação Nacional Independente dos Trabalhadores sobre Trilhos (Fnitst), filiada à CUT. “Querem derrubar com uma canetada algo que já é lei desde o governo João Goulart e foi reforçado em 1991 com outra mobilização dos trabalhadores, que incluiu vigília, passeata e ocupação em Brasília”, diz.
Os ferroviários da ativa foram transferidos para a Valec Engenharia, Construções e Ferrovias, vinculada ao Planejamento, que cuida do passivo patrimonial da Rede e estuda criar o trem-bala ligando Rio e São Paulo. Segundo sindicalistas, uma série de mecanismos artificiais têm sido criados para incrementar a remuneração dos ativos sem o devido repasse aos inativos, tais como abonos, vale-alimentação e gratificações incidentes sobre os cargos em comissão. “Pegaram uma empresa de construção com sede no Maranhão da família Sarney e querem encontrar correlação com as funções dos ferroviários. Não existe nem cargo para fazer a equiparação das funções. Isso foi proposital”, denuncia um sindicalista.
A reportagem do Estado de Minas tentou conversar por três vezes com o responsável pela inventariança da Rede, mas não foi atendida. No Ministério do Planejamento, a informação da assessoria de imprensa era de que o debate sobre a paridade já estava superado no governo e que não haveria porta-voz para falar sobre o assunto.
“Dá pena ver a Rede, que tanto serviço prestou ao país, acabar desse jeito”, lamenta a pensionista da Rede Maria da Glória Ferraz, do alto de seus 97 anos. Com câncer de pele, ela demonstra disposição incomum para a idade, apesar das cirurgias de enxerto que já sofreu. Sobrevive com R$ 800, que cobrem basicamente o custo do plano de saúde e dos medicamentos. Solteira, depende do auxílio de uma sobrinha aposentada pela Rede e da pensão deixada pelo pai, Francisco Ferraz Neto, que foi o primeiro tesoureiro da Rede Mineira de Viação (RMV), antiga Oeste de Minas. Lotado no escritório da Rede em São João Del Rei, era também responsável por percorrer as linhas em caso de desastres de trem.
“Naquele tempo, os diretores da Rede eram gente importante, de peso e medida. Hoje, dá para ver a decadência em que ficou a sede na Rua Sapucaí, 383, que virou mato puro. Uma prima foi lá visitar e voltou em prantos”, afirma. Segundo os relatos, nos tempos áureos chegaram a trabalhar perto de mil funcionários na antiga sede, na instalação luxuosa entre obras de arte retratando o seu fundador Barão de Mauá, relógios de parede e tapetes. Atualmente, o contingente de pessoas foi reduzido a 14.
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