Quando o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Carlos Ayres Britto, deixar o cargo, em maio do ano que vem, deixará para seu sucessor a tarefa de implementar as regras mais avançadas que o Brasil já viu para a escolha do presidente da República, governadores, senadores e deputados.
Ministro do Supremo Tribunal Federal desde 2003, Britto tem um estilo peculiar de subjugar as questões mais técnicas à sua trena humanista. Não é à toa que o ministro reúne todas as suas energias para uma preocupação em especial: impedir que o interesse público seja substituído pelo dinheiro na hora de escolher os administradores públicos e os legisladores do país.
“Minha meta é garantir o máximo de transparência possível”, afirma Britto. Ele evita antecipar detalhes da Resolução, em fase de discussão, que ele prevê pronta dentro de 18 dias. “O que posso dizer é que estamos pisando em ovos, porque é preciso muita segurança para que cada inovação tenha todo o respaldo técnico e legal para que se sustente.”
Mas ele não sonega a linha de raciocínio, com um mantra que repete para todas as plateias: “Quem faz doação eleitoral por baixo dos panos, cobra por baixo dos panos. É uma obrigação nossa garantir que as doações sejam feitas à luz do dia e que, em vez de poucos doadores oferecendo grandes quantias, tenhamos muitos doadores de pequenas quantias”.
A Folha de S.Paulo desse domingo anunciou que o projeto de Resolução prevê regras para barrar a doação oculta, obrigando os partidos a manterem conta bancária exclusiva para repasse a candidatos — o que permitirá relacionar empresa ao político beneficiado. O repórter Rubens Valente informa que, doando aos diretórios partidários, as empresas se livram de vincular seus nomes aos candidatos. Só em 2008, mais de R$ 250 milhões transitaram por essa via.
Só a Camargo Corrêa, no ano passado, injetou R$ 24 milhões nas eleições municipais de São Paulo. Na concepção de Britto, essa avenida escura será iluminada. Os partidos poderão ter que informar o que recebem e de quem recebem na internet, mensal ou trimestralmente.
Nas discussões do TSE trabalha-se com o ideal de um novo núcleo de auditoria e controle das contas partidárias. Algo que permita ir além do controle formal da contabilidade para avaliar a legitimidade das contas e recibos apresentados. Afinal, de pouco adianta as contas estarem corretas se os recibos não são legítimos.
Na última sessão do TSE do ano passado, o colegiado já aprovou Resolução que implica a informação ao eleitor de quem é o suplente do senador e os candidatos a vice nas chapas de governadores e presidente, com suas respectivas fotos estampadas na urna eletrônica. Antes, por proposta do próprio ministro Carlos Britto, já se havia determinado a inclusão do nome e foto dos candidatos a vice na eleição municipal. Passos certos em direção à transparência.
Ainda este ano o Tribunal deve reformatar o formulário eletrônico do pedido de registro de candidatura. Os postulantes deverão declarar detalhadamente seus bens e os fatos relevantes de sua vida pregressa. Além de averiguar a evolução patrimonial, o tribunal quer saber sobre o passivo de processos judiciais. Ainda que a informação não sirva para brecar a candidatura, será útil para a avaliação do eleitor.
O ministro Carlos Britto tem insistido em que o Judiciário não pode depender da reformulação legislativa para promover as mudanças necessárias. Ele entende que os princípios constitucionais da moralidade e da impessoalidade são auto-aplicáveis. “Vamos projetar um olhar mais contemporâneo, mais arejado para aperfeiçoar nossos costumes”, propõe ele.
Por Márcio Chaer
Consultor Júridico