Jornal do Brasil
Envolvidos na disputa pela presidência da Câmara e do Senado, os parlamentares vêm deixando de lado um desafio importante e que reencontrarão na volta do recesso: enfrentar a montanha de 1.152 vetos presidenciais que dorme nas gavetas, alguns datando ainda do governo de Itamar Franco.
Mais de mil vetos na gaveta do Congresso
Novos comandos da Câmara e Senado vão se deparar com 1.152 vetos ainda não analisados. Há projetos guardados desde a gestão Itamar Franco, mas senadores tentam mudar cenário
Raphael Bruno
BRASÍLIA
Além das eleições para a pre- sidência da Câmara e do Senado e a votação de projetos importantes, como as reformas tributária e política, parlamentares terão que enfrentar um desafio adicional na volta do recesso de fim de ano, no início de fevereiro: uma montanha de 1.152 vetos presidenciais aguarda, atualmente, apreciação do Congresso Nacional. A um ritmo que supera, em média, 200 novos vetos por ano, como uma bola de neve, o já elevado número destas prerrogativas do Executivo sem apreciação não para de crescer. O problema, agravado pela ausência de um calendário legislativo mais flexível e a falta de acordo entre líderes partidários em torno da questão, permanece uma afronta à Constituição que determina a análise de vetos pelo Congresso dentro de um prazo máximo de 30 dias e, juntamente com as medidas provisórias, um dos principais fatores de desequilíbrio da relação entre Executivo e Legislativo.
Entre muitos itens sem importância que se perdem no meio da extensa lista de vetos não apreciados alguns dos quais remontam a 1994 e à assinatura do ex-presidente Itamar Franco algumas matérias e temas polêmicos onde houve divergências entre os poderes chamam a atenção. Entre as mais recentes, destaca-se o veto parcial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao texto da lei 11.648/08, que dispõe sobre o reconhecimento formal das centrais sindicais. Num ato visto por críticos como protecionismo a uma de suas principais bases eleitorais, Lula vetou o artigo 6º da lei e, junto com ele, a previsão de que centrais e sindicatos prestassem contas ao Tribunal de Contas da União sobre a aplicação dos recursos provenientes de repasses do recém-criado Imposto Sindical. A justificativa oficial do Palácio do Planalto foi a de que a Constituição veta ao poder público interferência na autonomia sindical.
Advogados
Outro veto que provocou po- lêmica foi ao parágrafo 5º da lei 11.767/08, que dispõe sobre a inviolabilidade do local e instrumentos de trabalho do advogado. Para irritação da Ordem dos Advogados do Brasil, o Palácio do Planalto vetou o trecho que definia como instrumento de trabalho inviolável todo e qualquer bem móvel ou intelectual, incluindo escritórios, computadores, telefones, arquivos impressos ou digitais, bancos de dados, livros, anotações e quaisquer documentos.
O governo entendeu que clientes investigados poderiam valer-se da norma para ocultar práticas criminosas em escritórios de advocacia e dificultar a obtenção legítima de provas. A criação ou o aumento de despesas embutidas em projetos de lei também costuma atrair vetos presidenciais. Num dos casos mais exemplares, o governo vetou, em 2006, a extensão do reajuste do salário mínimo aos aposentados e pensionistas do Regime Geral de Previdência Social. Devido ao veto, enquanto os trabalhadores que recebem o salário mínimo comemoraram reajuste de 16,6%, aposentados e pensionistas que ganhavam acima do mínimo tiveram que se contentar com um aumento de 5% em seus benefícios.
A melhor solução para o Congresso não ter que lidar com essa quantidade elevada de vetos é trabalhar sem se envolver com questões que não passam de demagogia e eleitoralismo defende Beto Albuquerque (PSB-RS), vice-líder do governo desde o primeiro ano do primeiro mandato de Lula. A gestão petista do Palácio do Planalto mantém, até o momento, uma média ligeiramente mais elevada de vetos do que durante a passagem de oito anos de Fernando Henrique Cardoso pela Presidência (confira quadro). Muitas vezes, há coisas que são incorporadas em projetos de lei apenas para desgastar o Executivo, obrigado a vetá-las, como aumentos de despesas irreais e irresponsáveis. O deputado reconhece, no entanto, que o problema ultrapassa em muito atitudes de oportunismo da oposição.
O Congresso Nacional comete, na verdade, uma omissão constitucional avalia Albuquerque, lembrando do prazo constitucional de 30 dias para apreciação de veto presidencial. É isso que ocorre quando não se tem um Legislativo que não dependa da vontade do Executivo. Muitas vezes, quando se resolve apreciar esses vetos, eles nem fazem mais sentido, estão totalmente descontextualizados e ultrapassados por causa do tempo que se demorou para apreciá-los.