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Empresas aventureiras prejudicam SE

13/7/2009

Empresas de pequeno porte estão assumindo obras públicas que depois são paralisadas por falta de estrutura técnica. Esse discurso unânime entre gestores e construtores aponta para obras como a reforma do Teatro Atheneu, sede da PGE, urbanização da Atalaia Nova/Barra dos Coqueiros, entre outras. A avaliação geral é a de que se trata de empresas aventureiras que se empolgam com o valor da obra, vencem a concorrência pública para depois não dar conta do serviço.

“É um problema difícil de resolver, pois essas empresas estão amparadas na lei 8.666 e na Lei Geral da Micro e Pequena Empresa. O sindicato não vê com bons olhos essa situação que está prejudicando a própria empresa e a classe como um todo”, disse o diretor de obras públicas do Sindicato da Indústria da Construção Civil, (Sinduscon), João Carvalho.

Segundo ele, existem micro empresas hoje fazendo obras de R$ 5 milhões sem suporte para isso. Ele faz uma analogia: “É como você ter condições para comprar um Fiat, mas se mete a comprar um Fusion. Não vai ter condições de pagar”. Na avaliação do construtor, o grande gargalo está na Lei Geral da Micro e Pequena Empresa que privilegia as MPE’s. “Essa lei foi um tiro no pé. O Sindicato nada pode fazer. O Estado, também. As consequências estão aparecendo agora”, falou.

O empresário citou ainda casos de empresas que trabalham em média com 20 a 30 funcionários, mas se arriscam a pegar uma obra que exige no mínimo 150 operários. “Não vai dar conta. São empresas acostumadas a fazer uma casa e pegam um prédio de 12 andares. Se ela passasse de uma casa para 10 casas, depois para um prédio de três andares, e só depois, então, para um prédio de 12 andares, aí sim, ganharia experiência e teria condições de fazer a obra maior, mas não é isso que acontece”, voltou a comparar.

O procurador geral do Estado, Márcio Rezende, acredita que está havendo uma saturação da oferta de obras públicas no Estado e isso também acaba influenciando para a paralisação de algumas delas. Mas, o principal motivo, na avaliação dele, é a falta de estrutura de empresas pequeno porte.

Mercado imaturo

Ele entende que o benefício concedido às micro e pequenas empresas que vigora no Estatuto da Micro e Pequena Empresa pegou um mercado imaturo que está amadurecendo aos poucos. “Quando da edição da Lei das Micro e Pequenas empresas, elas não estavam com capacidade técnica e de trabalho para fazer frente a uma oferta significativa de obras públicas. Quando foi posto em prática essa contratação maciça de pequenas empresas, elas não tiveram cacife técnico e de pessoal para usufruir desse espaço aberto no mercado”, comentou.

Márcio Rezende disse que o resultado desse quadro é a descontinuidade de contratos. “A administração na medida do possível tem procurado remanejar contratos, fazer novas licitações, mas a própria legislação exige uma série de fases que terminam contribuindo para uma lentidão desses procedimentos porque tem que cumprir as etapas legais”, comentou.

É na Procuradoria Geral do Estado que nasce e morre o contrato, no caso de haver descumprimento de alguma das cláusulas contratuais. “Temos rescindido algumas dezenas deles”, disse o procurador sem precisar o número de rescisões. Mas, segundo a Secretaria de Infra-Estrutura do Estado, somente da Cehop, onde está reunido o maior volume de contratos, existem 34 contratos em situação de rescisão. Desses, 23 já foram rescindidos e nove estão em processo de rescisão.

“É uma frustração muito grande porque o gestor possui o dinheiro, a previsão orçamentária, a legislação está toda amarrada e subitamente ele se vê diante de uma situação inusitada que é a paralisação de uma obra por falta de cacife da empresa”, comentou Márcio Rezende.

A própria PGE está sofrendo disso na própria carne. A obra de reforma começou em novembro do ano passado, mas dois meses depois, a empresa vencedora entrou em colapso e não tinha sequer mão-de-obra pra colocar no canteiro. A empresa que ganhou a obra da PGE venceu também outras quatro licitações e não deu cabo a nenhuma. Teve o contrato suspenso e está agora na iminência de perder de vez o direito de vir a participar de concorrências públicas.

Uma nova licitação foi aberta, uma outra empresa já foi contratada e a obra que era para estar pronta no mês passado, só deverá ser entregue, caso não o problema não volte a ocorrer, no ano que vem. “É lamentável, mas há empresas que entram na seleção pública sabendo que não vão dar conta. Entram, na esperança, creio eu, porque não me parece que haja má-fé, de se ajustar ao cronograma da obra, é uma oportunidade que nem todo o empresário quer deixar escapar, mas não deixa de ser uma irresponsabilidade, pois está lidando com dinheiro público”, opinou.

Prejuízos

Os prejuízos com os atrasos e interrupções de obras alcançam poder público, construtores e a população. O Estado perde tempo e dinheiro com a abertura de novo processo de seleção pública. A população porque deixa de usufruir da obra. Só para lembrar, o Centro Profissionalizante do Estado, inaugurado no mês passado, pelo presidente Luís Inácio Lula da Silva, passou mais de uma década para ser inaugurado privando a população de uma escola técnica. Uma série de fatores levou a isso, entre eles, incapacidade das empresas vencedoras. A ponte Joel Silveira está sendo construída por um consórcio de grandes empresas, mas também está emperrada e só agora ganhou fôlego (ver boxe). Sem ponte, turistas e sergipanos como recurso único de viagem a travessia pelo rio Vaza Barris.

“Nós construtores perdemos porque os sérios acabam pagando pelos aventureiros”, disse João Carvalho, ao ressaltar que não acredita em má-fé desses empresários, mas na falta de experiência e de responsabilidade. Além disso, os próprios construtores que entram, iniciam a obra e a paralisam depois, também saem prejudicados uma vez que sofrem das penalidades previstas na legislação.

Penalidades

Segundo o procurador, as penalidades para a empresa que quebra o contrato vão desde a suspensão temporária de direito de contratar com o Estado, até inidoneidade contratual com o Estado, ficando banida de participar de seleções públicas. “É um procedimento suicida, porque naquele afã de participar de tudo pega muito mais do que poderia e a punição tem que vir”, comentou.

O secretário de infra-estrutura do Estado, Valmor Barbosa, disse que tem se reunido constantemente com empresas que vem passando por essa situação para conversar e ver que solução pode encontrar. Disse ainda que tem rescindido vários contratos por descontinuidade de cronograma. Segundo ele, é um problema que vem acontecendo em todo o país “São empresas que ganham várias obras e não têm capacidade operacional nem financeira. Isso acontece porque não tem limitador. Não podemos limitar uma empresa porque pega obra do governo federal, estadual e municipal ao mesmo tempo. Se na licitação atende todas as exigências de um edital e ela vence, então pode iniciar a obra”, falou. “Não tem como amarrar os editais. Pedimos as garantias, garantia de participação, a comprovação do balanço, caução, então são várias coisas que a Lei 8666/93 exige, nós cumprimos, mas infelizmente, acontece isso”, acrescentou.

Na avaliação de Márcio Rezende, a legislação merece alguns ajustes e os editais devem trazer amarras técnicas e de estrutura. “A Cehop está muito atenta a isso. A situação tende a melhorar”, falou. Segundo ele, o Estado, tem buscado algumas alternativas, elencando algumas amarras, como a exigência da capacidade técnica e da idoneidade técnica e financeira junto ao CREA. O objetivo é possibilitar um filtro para que barre as empresas aventureiras. Ele lembrou que esses cuidados a serem adotados precisam atender as exigências legais da elaboração de editais que não podem trazer direcionamentos a fim de dar chances ao maior número possível de participantes.

Ponte tem quatro anos de atraso

A Ponte Joel Silveira depois de pronta vai ligar o Mosqueiro às praias do litoral sul, encurtando viagem à Praia do Saco e a Salvador. As obras foram iniciadas em dezembro de 2005, foram paralisadas 10 meses depois com apenas 5% de serviço realizado. Foi retomada em outubro do ano passado e só deve terminar no final do ano, quatro anos após ter sido iniciada. Os trabalhos entraram agora em ritmo acelerado com 600 homens na linha de frente.

Essa obra está sendo executada por um consórcio de grandes empresas, mas mesmo assim, não vem cumprindo o cronograma. Nesse caso, o problema está no valor orçado da obra e o executado. A obra foi orçada em R$ 55.014.242,45, mas a empresa vencedora ofereceu valor bem abaixo disso - R$ 43 milhões - vencendo a concorrência.

Segundo o secretário, a empresa ganhou a obra com a concepção de ponte de aço com concreto. No desenvolvimento da execução, no ano passado, a empresa fez vários pleitos para mudar a obra para concreto, a fim de baratear os serviços, mas o governo não aceitou. No final do ano passado, o DER emitiu uma multa que está sendo contestada pelo consórcio na Justiça.

Enquanto isso, a obra vem sendo tocada com 610 homens. A ponte Jornalista Joel Silveira terá 1.080 metros de comprimento e 14,2 metros de largura.


Fonte: Jornal da Cidade