Em junho de 2008, quando a Vivo preparava a ampliação de sua rede para todo o Nordeste, o pernambucano Marcos Leão viu na estreia da operadora uma oportunidade de negócio: abriu seis quiosques e duas lojas da companhia de telefonia móvel - distribuídos em seu Estado natal, no Rio Grande do Norte, em Alagoas e na Paraíba. Oito meses mais tarde, porém, começou a baixar as portas delas. No dia 22 de julho, não restava nenhuma unidade aberta. "Eu não tinha mais como lidar com 13 meses de prejuízo. Perdi R$ 2,5 milhões", afirma.
A história se repete. Assim como Leão, outros empreendedores que resolveram se tornar lojistas da Vivo desistiram do negócio pouco tempo depois. No Ceará e no Piauí, alguns distribuidores movem ações judiciais contra a empresa.
Segundo levantamento feito pelo Valor, ao menos 35 lojas já encerraram suas atividades nos seis Estados nordestinos que a operadora começou a atender gradativamente a partir de outubro do ano passado (Alagoas, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Piauí e Rio Grande do Norte). O número pode ser ainda maior, já que não há informações sobre municípios do interior. De qualquer forma, o volume é significativo. A Vivo afirma que sua rede de distribuição nessa região tem 191 revendas e lojas autorizadas, além de sete unidades próprias.
Em todos os casos, as alegações são muito parecidas. Os varejistas reclamam principalmente da demora no lançamento das operações. A projeção inicial era de que a Vivo ligaria sua rede entre julho e novembro, começando pelas principais cidades dos mercados cearense e pernambucano e terminando pelo Piauí. No entanto, a operadora fez sucessivos adiamentos e as estreias só ocorreram entre outubro e abril deste ano. Enquanto isso, os lojistas estavam com tudo pronto - inclusive pagando aluguel e salário de funcionários.
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A loja que Laércio Gurgel montou em Teresina ficou pronta em novembro, mas ele desistiu de esperar a chegada da Vivo, que só ocorreu cinco meses mais tarde. "Eu já acumulava mais de R$ 100 mil em despesas. Foi uma decisão acertada para evitar que esse prejuízo aumentasse ainda mais", diz. Com o objetivo de ver suas perdas reparadas, o empresário entrou com ação na Justiça do Piauí há cerca de um mês. "Quando você é chamado, os olhos brilham, havia certeza de um bom negócio. Os lojistas estão arrasados", afirma Gurgel, que já trabalhou na TIM. Segundo ele, a Vivo teria acenado com a oferta de crédito para os lojistas montarem um estoque de aparelhos, mas isso não aconteceu.
Os distribuidores também se queixam de que, até agora, a Vivo não havia feito promoções para se diferenciar dos concorrentes, o que não ajuda na hora das vendas. A única grande oferta que a operadora fez na sua chegada à região foi malsucedida: quando começou a operar no Recife e em Fortaleza, a Vivo lançou uma promoção que dava bônus mensal de R$ 1 mil para fazer ligações a outros números da empresa. A procura foi tanta que a operadora teve de cancelar a promoção dois dias mais tarde, temendo que a rede não aguentasse. Mas esse recuo abalou a credibilidade da companhia no mercado nordestino - e a Oi, empresa mais forte da região, não perdeu a chance de explorar o episódio em suas campanhas publicitárias.
"A repercussão foi muito negativa", afirma o advogado George Pontes, representante de três distribuidores cearenses que fecharam as portas e foram à Justiça contra a Vivo. "Depois disso, houve um esvaziamento das lojas."
Para completar, a rede da Vivo funciona numa frequência diferente da que é utilizada pelas concorrentes. Com isso, os clientes da Vivo têm menos opções para adquirir aparelhos no mercado de segunda mão, que é muito forte no Nordeste. Os chips da companhia não servem em qualquer modelo. "O consumidor nordestino costuma ter o chip de várias operadoras para aproveitar a melhor tarifa de cada uma. Mas, no caso da Vivo, ele tem de comprar outro aparelho", afirma Ivan Barbosa Lima, dono de uma loja da operadora no Recife. O comerciante, que trocou sua revenda da TIM por uma representação da Vivo, diz não estar arrependido da mudança, mas observa que o negócio não vem correndo conforme imaginou.
O resultado dessa sucessão de problemas é que o volume de vendas feito pela Vivo na região, até agora, é muito pequeno. Até o fim de junho, a operadora contabilizava 630 mil assinantes nesses seis Estados, o que significa uma participação de 2,45% no mercado local. A companhia já atuava na Bahia, em Sergipe e no Maranhão - se somados esses mercados, a fatia da empresa no Nordeste sobe para 12,33%. Mesmo assim, fica longe do desempenho que a empresa apresenta em termos nacionais.
A Vivo é a maior operadora de telefonia móvel do país. São 46,8 milhões de assinantes, número que equivale a 29,33% dos celulares habilitados no Brasil, segundo dados da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).
Os atrasos podem ter custado clientes valiosos para a operadora, já que, no ano passado, o mercado nordestino de telefonia móvel cresceu acima da média nacional.
O vice-presidente de operações da Vivo, Paulo Cesar Teixeira, reconhece que o número de assinantes nos novos Estados atendidos pela companhia está aquém das expectativas. No entanto, ele minimiza os problemas com os lojistas. "A grande maioria dos nossos parceiros está contente", afirma. "Não dava para esperar retorno no curto prazo, mas a perspectiva é muito positiva."
Segundo Teixeira, os atrasos no lançamento das operações deveram-se à dificuldade de negociar com as prefeituras e os Estados a instalação das estações radiobase. "Em Teresina, tivemos que convencer os vereadores a mudar uma lei", ressalta. Outro obstáculo apontado pelo executivo foi a resistência das operadoras concorrentes em compartilhar sua infraestrutura com a Vivo.
Teixeira afirma que a operadora preferiu entrar nos novos mercados somente quando pudesse garantir a qualidade de sua rede. A partir de agora, disse ele, a empresa está pronta para entrar numa nova fase.
Os primeiros sinais dessa reação tornaram-se visíveis ontem, quando a Vivo apresentou pela primeira vez um cardápio de ofertas para a região. E elas são ousadas: preveem descontos de 50%, até dezembro, nos planos pós-pagos oferecidos pela empresa. Para anunciar a estratégia e acalmar os ânimos dos lojistas, Teixeira reuniu-se com distribuidores nordestinos na semana passada.
No entanto, alguns comerciantes decidiram se organizar para cobrar as perdas que afirmam ter acumulado. Anteontem, 12 lojistas da Vivo no Recife decidiram criar uma associação para representar seus interesses. A ideia é que cada lojista (ou ex-lojista) entre com ações na Justiça individualmente para pedir indenização.
Segundo Teixeira, a Vivo está ressarcindo os distribuidores pelo atraso no lançamento de sua rede. "É preciso apresentar os comprovantes das despesas", afirma.
Talita Moreira e Carolina Mandl, de São Paulo e do Recife