Na CPI da Petrobras, governo rejeita requerimentos polêmicos da oposição
Ex-secretária da Receita Federal, Lina Vieira, fez questão de manter, durante seu esperado depoimento na Comissão de Justiça do Senado, ontem, o teor de entrevista em que revelou ter recebido da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Roussef, pedido para agilizar investigação fiscal do órgão em empresas de filho do presidente do Senado, José Sarney: “Não mudo a verdade no grito nem preciso de agenda para dizer a verdade. A mentira não faz parte da minha biografia, afirmou ela descrevendo mais de uma vez, em detalhes, o seu encontro com a ministra.
Os senadores governistas também pressionaram por evidências de fatos. Para justificar a falta de provas e de registro do encontro em sua agenda, Lina Vieira alegou que a audiência, no gabinete da ministra, a pedido de Dilma, teve caráter reservado.
A ex-secretária disse não ter se sentido coagida pela ministra com o pedido e que não voltou mais a tratar do assunto com ela. Revelou que sua atitude se restringiu a conferir o andamento de processo na Receita sobre atividades empresariais de Fernando Sarney. Vários senadores governistas, entre eles o líder do PT, Aloizio Mercadante alertaram que ela teria infringido normas que regem a conduta dos servidores públicos ao deixar de relatar aos superiores fato que considerou anormal.
"Só tem dois caminhos: ou a senhora prevaricou ou a senhora não está falando a verdade", disse Mercadante, cuja tese foi reforçada pelo senador Almeida Lima.
Lina afirmou que o convite para a reunião foi feito pela chefe de gabinete de Dilma, Erenice Guerra. Solicitada pela oposição a apresentar detalhes que ajudassem a comprovar os fatos, ele lembrou que demorou a identificar o caminho até o gabinete da ministra e Erenice foi ao seu encontro.
A ex-secretária também enfatizou não ter mágoa por ter sido exonerada do cargo. Segundo ela, em funções de confiança as alternâncias são naturais. Lina disse também que dois jornalistas a procuraram já com a informação relacionada ao seu encontro com Dilma, desejando confirmar os fatos.
"Confirmei, sim. Por que haveria de negar a verdade? O que me moveu foi o hábito de respeitar a verdade", afirmou a Lina.
A audiência foi aprovada na última reunião da Comissão de Justiça, numa ação articulada pela oposição, aproveitando que só restava um senador da base no local. Durante a argüição, o senador Tasso Jereissati manifestou solidariedade à depoente, condenando a forma "agressiva e hostil" com que alguns senadores da base de apoio ao governo estavam tratando a convidada.
Posição
Lina Vieira além de confirmar o encontro disse que seu objetivo não é prejudicar a ministra ou provocar polêmicas públicas, mas sim preservar a sua biografia. "Quero deixar claro que não houve, não há, nenhuma outra intenção, nem tampouco sentimento de mágoa por haver deixado o comando da Receita Federal. Fui exonerada do cargo sem nenhum ressentimento com o governo. A natureza do cargo de confiança é essa: a substituição se dá quando o superior acha necessário. Não houve da minha parte problema algum".
Lina Vieira disse ainda que o encontro não constou em sua agenda oficial, nem acredita ter sido registrado na agenda da ministra Dilma. "Na minha agenda isso não constou. Mas eu não preciso de agenda para falar a verdade."
A ex-secretária disse que esse foi o único encontro que manteve com Dilma no período em que esteve no governo. Ela negou também que tenha pretensões políticas ao revelar o encontro com a pré-candidata do PT. "Não busquei, não desejei nem desejo toda essa polêmica e exposição. Não almejo nem em sonho disputar cargos eleitorais, situação em que exposição na mídia é muito útil. Não vim à comissão fazer jogo de A, B, X ou Y. Não tenho interesse em polêmica. Meu único interesse é preservar minha história de vida."
Discreta
Após quatro horas de depoimento na Comissão de Justiça do Senado, Lina Vieira, deixou a reunião sem falar com a imprensa. Para a oposição, suas declarações reforçaram a tese de que a ministra, de fato, interferiu no órgão. O senador Antônio Carlos Magalhães Júnior autor do requerimento de convocação de Lina, avaliou que a versão da ex-secretária serviu para comprovar a existência do suposto encontro. "Claro que a gente esperava mais informações, mas agora não tenho dúvidas de que o encontro existiu", disse.
A oposição afirma que vai aguardar que Dilma se manifeste sobre o depoimento de Lina Vieira para decidir se entra com um requerimento de acareação na CPI da Petrobras. O senador Álvaro Dias, por seu lado, pretende insistir no pedido de acareação. Do lado do governo, o fato de a ex-secretária ter afirmado que a ministra não interferiu no mérito da investigação contra Fernando Sarney foi bem recebido. De uma maneira geral, o depoimento de Lina não gerou impacto algum. A expectativa criada não se confirmou. A ex-secretária manteve o que vinha dizendo. E, de certa forma frustou a expectativa da oposição
CPI com represália
A CPI da Petrobras ouviu ontem a cúpula da Agência Nacional do Petróleo para tratar das denúncias de irregularidades na distribuição de royalties aos Estados. A base governista respondeu ontem mesmo à manobra da oposição que permitiu o depoimento da ex-secretaria da Receita Federal Lina Vieira no Senado e tratou de rejeitar na CPI da Petrobras requerimentos apresentados pelos oposicionistas. Assim, foram excluídos da CPI requerimentos polêmicos que pediam, por exemplo, informações sobre a prestação de contas da Fundação José Sarney e também de uma nova convocação da ex-secretária da Receita.
Conselho de Ética se reúne após um novo tom do PSDB e Sarney
Na véspera da reunião do Conselho de Ética surgem os sinais conciliadores... E no PT ainda um problema
O Conselho de Ética do Senado volta a reunir-se hoje,quando deverá colocar em votação recursos apresentados contra sua decisão de arquivar denúncias e representações contra os senadores José Sarney e Arthur Virgílio. Seu presidente, o senador Paulo Duque considerou ineptas seis denúncias e cinco representações contra Sarney, alegando que elas se sustentavam apenas em matérias de jornais. As ações foram apresentadas pelo senador Arthur Virgílio e pelo PSDB, pedindo investigação de Sarney por suposto envolvimento com os "atos administrativos secretos", pretensos desvios de verba na Fundação Sarney e pela presença de uma empresa de um neto seu na intermediação de créditos bancários oferecidos a servidores do Senado.
Duque também não aceitou uma denúncia do PMDB contra o senador Arthur Virgílio, acusado de ter autorizado um funcionário de seu gabinete a estudar no exterior recebendo salários do Senado, de tomar empréstimo com o ex-diretor geral do Senado e por ter concordado que o Senado gastasse com a saúde de sua mãe valores superiores aos concedidos nestes casos.
Paulo Duque recusou a representação por entender que pedir dinheiro emprestado não é crime e a culpa do gasto elevado com a saúde é problema de quem o autorizou. No caso do funcionário que estudou no exterior, Paulo Duque opinou que a decisão de Arthur Virgílio de devolver antecipadamente ao Senado os gastos com o salário extingue a punibilidade do possível crime.
O plenário do Conselho de Ética pode anular o arquivamento de denúncias e representações, bastando que metade dos senadores presentes vote contra Paulo Duque e a favor da abertura de investigações.
Um novo tom
Para o presidente do Senado, José Sarney deveria ser função exclusiva do Poder Judiciário a cassação do mandato de parlamentares. Em um rápido discurso na tribuna do Senado, Sarney disse que o Legislativo não tem condições de realizar julgamentos com "isenção política", por isso não deve cassar senadores ou deputados. "Eu estou aqui há muitos anos e não cassei ninguém. Essa função devia ser reservada à Justiça. A isenção política deve estar presente nos julgamentos", afirmou. Sarney falou na véspera da reunião do Conselho de Ética da Casa analisar 11 recursos que podem resultar na abertura de processos por quebra de decoro parlamentar.
Em discurso conciliador, o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra foi à tribuna do Senado para dizer que o presidente da Casa, José Sarney, não deve ser cassado, apesar das denúncias: "É claro que o presidente Sarney sofre um ataque muitas vezes injusto. Tudo que acontecer com ele, comigo ou com outros senadores é questão pública. Mas se vamos cassar alguém? É claro que não. Se vamos discutir esses fatos? É claro que sim", disse o tucano, que se diz "antigo amigo pessoal" do peemedebista.
Ao tratar do tom incisivo de outros colegas, inclusive do seu próprio partido, Guerra afirmou que foi um dos últimos senadores tucanos a apoiar o pedido de afastamento de Sarney. Para ele, as denúncias contra qualquer homem público devem ser avaliadas realmente pela Justiça, sem que esse corra o risco de perder seu mandato ou o cargo ao longo do processo apenas por pressão política.
Guerra ponderou que apesar de sua estima pessoal pelo presidente do Senado, não mistura a relação pessoal com a política. Tanto é assim, disse ele, que apoiou Tião Viana na eleição para a presidência da Casa no início do ano.
"Tenho muita estima pelo presidente José Sarney. Ele tem uma biografia. Eu o conheci há muitos anos. É um homem democrático. Deu várias lições aos brasileiros, dirigiu uma mudança dramática. Sempre foi cordial, civilizado, tem o respeito do povo. É um brasileiro que merecia uma boa imagem do seu país", afirmou.
Guerra disse que não aceita a transformação do Senado em um local de revanchismo entre os parlamentares. "Eu não aceito, eu não admito, de forma alguma, o expediente de transformar Senado, democracia, parlamento, num quadro em que pessoas, a pretexto da discordância, promovam a revanche e ameaça, distribuição fortuita de notas e informações fraudulentas para ameaçar quem quer que seja", afirmou. Sarney, por sua vez, afirmou que "jamais provocaria qualquer constrangimento" ao presidente do PSDB, de quem disse ser amigo pessoal. "Estou aqui há muitos anos, nenhum jornalista foi procurado por mim para denunciar algo contra alguém. Eu tenho me pautado por essa conduta. Considero o seu discurso de ponderação como um código de comportamento que se deve seguir nesta Casa", afirmou Sarney a Guerra.
Mercadante reage
O líder do PT no Senado, Aloízio Mercadante, não concorda com manobras para a indicação para o Conselho de Ética de senadores simpáticos ao presidente do Senado, José Sarney. Ela envolveria indicação de Roberto Cavalcanti e Romero Jucá para o Conselho em vagas do bloco liderado por Mercadante. Existem duas vagas de titulares não ocupadas porque os senadores João Ribeiro e Antonio Carlos Valadares decidiram deixar o colegiado após a eleição de Paulo Duque. Mercadante, porém, descartou a manobra. “Eu me recuso a fazer este tipo de coisa.”
Carlos Fehlberg