Uma onda de terror em Salvador expõe o descalabro
da segurança pública no estado
Até pouco tempo atrás, a Bahia só dava boas notícias, graças às oportunidades criadas pelo turismo no litoral do estado e pela implantação de grandes fábricas, como a da montadora Ford. Agora, sua economia cresce menos que a do Nordeste e perde investimentos para os vizinhos: Pernambuco vive uma onda de crescimento sem precedentes; Sergipe recebeu 25 novas indústrias desde 2007. O sinal mais dramático da estagnação na Bahia é o aumento da criminalidade. A taxa de homicídios de Salvador é o dobro da do Rio de Janeiro, e os bandidos impuseram o toque de recolher em onze bairros da cidade. Durante toda a semana passada, bandos armados vandalizaram a capital baiana em retaliação à transferência de um dos chefes locais do tráfico de drogas, Cláudio Campanha, para um presídio em Mato Grosso do Sul. Até a sexta-feira 11, eles haviam disparado contra carros da polícia, destruído dez bases da Polícia Militar e incendiado dezesseis ônibus. Nos tiroteios, dez policiais e civis foram feridos e seis facínoras mortos. A baderna foi urdida por uma espécie de PCC baiano, que, paradoxalmente, se autointitula "Comissão da Paz" (CP). Dias antes dos ataques, o governo interceptou telefonemas nos quais os traficantes combinavam a ação, mas não tomou providências.
A polícia local soube da existência do CP em 2007. O bando tem conexões com seu congênere paulista, que escolheu Salvador para esconder integrantes seus. Seis deles foram presos na capital baiana nos últimos quatro anos. Supõe-se que, em troca da cobertura proporcionada pelo CP, o PCC forneça armas e dinheiro graúdo aos facínoras baianos. Em uma das operações que resultaram na prisão de bandidos oriundos de São Paulo, foram apreendidas na mansão duas metralhadoras antiaéreas, rádios comunicadores e 20 000 dólares.
É falta de polícia, e não sociologia, que explica a proliferação da criminalidade na Bahia. Dos 417 municípios do estado, 135 não têm delegado. O governo aprovou em concurso e treinou 102 profissionais para ocupar essa função – mas não os empossa porque afirma não ter dinheiro para pagar seus salários. Os recursos destinados a policiamento diminuem desde 2007. Naquele ano, o orçamento do estado destinou 217 milhões de reais para tal fim. Desses, apenas 59 milhões foram gastos. Em 2008, dos 125 milhões de verba, somente 36 milhões foram executados. No interior, faltam viaturas. Na capital, os policiais não têm munição para enfrentar a bandidagem. No poder desde 2006, o governador Jaques Wagner afirmou que dedicaria 2009 à gestão pública. É uma promessa surpreendente até mesmo para os arrastados parâmetros temporais baianos.
Leonardo Coutinho
REVISTA VEJA