Gerson Camarotti - O Globo; Agência Câmara
BRASÍLIA - A Câmara vai divulgar na internet, dentro de 45 dias, a prestação de contas dos deputados para ressarcimento da chamada verba indenizatória, usada para gastos extras nos estados. Mas esta prestação tem restrições. Não serão publicados na internet o número do Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) das prestadoras de serviços nem as cópias das notas fiscais. Estarão disponíveis, no site da Casa apenas nome do fornecedor, número da nota fiscal ou recibo, valor correspondente e natureza do gasto.
Na prática, a medida vale a partir de abril. Não serão disponibilizadas as notas fiscais anteriores à mudança de regra. Os deputados recebem um salário mensal bruto de R$ 16.512,09, mais uma verba indenizatória de R$ 15 mil por mês, a título de despesas com aluguel, manutenção de escritório, alimentação, serviços de consultoria e pesquisa, contratação de segurança, assinatura de publicações, TV a cabo, internet, transporte e hospedagem. O deputado é ressarcido ao apresentar os comprovantes fiscais desses gastos. Segundo a Câmara, os 513 deputados apresentam à administração da Casa cerca de 17 mil notas fiscais por mês.
Após o anúncio, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), também defendeu o fim dos sigilos das notas fiscais apresentadas pelos senadores. Sarney disse que o assunto deverá ser discutido nas próximas reuniões da Mesa, que ainda não tem data marcada.
O tema ganhou relevância na Câmara depois que surgiu a suspeita de que o deputado Edmar Moreira (MG), que renunciou à segunda vice-presidência da Câmara, teria repassado recursos da verba indenizatória às suas próprias empresas de segurança particular.
O deputado, que foi desfiliado do DEM, também é acusado de fraudar a Previdência e de não declarar à Justiça Eleitoral a posse de um castelo no interior de Minas Gerais, o que é negado pelo parlamentar.
Segundo o primeiro-secretário da Câmara, Rafael Guerra (PSDB-MG), o CNPJ não será divulgado porque "abre a vida das empresas e a gente (deputados) não escolhe folha corrida de empresa". Quanto à ausência das cópias, Guerra alegou dificuldades técnicas, já que seria impossível digitalizar as 17 mil notas emitidas para os parlamentares. ( Áudio: Rafael Guerra diz que será criado um portal da transparência da Câmara para divulgar as notas da verba indenizatória )
"(O CNPJ) abre a vida das empresas e a gente (deputados) não escolhe folha corrida de empresa"
O deputado prometeu, no entanto, que qualquer pessoa, sem restrições, poderá solicitar as notas caso haja dúvidas sobre os documentos. Mas ainda não há definição sobre a quem recorrer para solicitar os originais.
Ainda de acordo com Guerra, desde a criação da verba indenizatória, há oito anos, já foram emitidas mais de 1,5 milhão de notas, e divulgar seus detalhes seria inviável.
O presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), afirmou que o prazo de 45 dias para que os dados estejam disponíveis no site foi pedido pela área técnica da Casa. Não serão disponibilizadas as notas fiscais anteriores à mudança de regra.
"Se isso não trouxer mais transparência à Casa, não saberemos mais o que fazer"
- Se isso não trouxer mais transparência à Casa, não saberemos mais o que fazer - afirmou Temer.
O primeiro-secretário da Câmara admitiu que as denúncias contra Moreira , podem ter originado a pressão pela maior transparência dos gastos dos deputados.
- Isso pode ter originado maior atenção da mídia em relação a esse tema, e por isso assumimos o compromisso de resgatar a imagem da Casa. A Câmara começa a assumir esse compromisso de transparência - disse Rafael Guerra.
Ainda de acordo com o 1º secretário da Câmara, será feito um estudo financeiro sobre o impacto de uma eventual incorporação da verba indenizatória ao salário dos deputados. Guerra informou que o assunto não foi discutido na reunião desta terça-feira, mas está em pauta na imprensa e precisa ser avaliado.
- A verba indenizatória sempre foi foco de polêmica. A incorporação tem repercussões políticas e econômicas. Vou fazer um estudo sobre o efeito financeiro, não só aqui, mas em cascata nas assembleias nos estados - disse Guerra.
Para o deputado, uma eventual incorporação só vai ser aprovada se representar redução de gastos. Ele alertou, ainda, sobre a necessidade de avaliar o efeito cascata que essa mudança poderia gerar nas assembléias legislativas.