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'Estado' sob censura há 90 dias

29/10/2009

Para o ministro Celso de Mello, do STF, a censura judicial prévia a jornais é "inaceitável, intolerável e insuportável".
Decano do STF diz que censura prévia é ""inaceitável e intolerável""

Para Celso de Mello, medida que proíbe "Estado" de publicar informações sobre a Operação Boi Barrica é inadmissível, "especialmente num regime fundado em bases democráticas"

Fausto Macedo

 
O ministro Celso de Mello, decano do Supremo Tribunal Federal, mandou um recado categórico a autoridades que impõem censura à imprensa. "Os tribunais devem se mostrar impregnados dessa consciência democrática de que agora vivemos um novo tempo, o tempo de liberdade. Liberdade com responsabilidade, é evidente, mas não faz sentido essa proibição apriorística que é um veto inaceitável, intolerável e insuportável. Isso não pode ser admitido, especialmente num regime fundado em bases democráticas."

O Estado está sob censura desde 31 de julho, por ordem do desembargador Dácio Vieira, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, que acolheu pedido de Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Sem falar especificamente sobre o caso, o ministro advertiu. "A censura governamental, emanada de qualquer um dos 3 poderes, é a expressão odiosa da face autoritária do poder público. Representa interferência indevida na vida dos cidadãos que não podem estar sujeitos a critérios definidos pelos detentores do poder. O debate sobre assuntos públicos tem que ser tratado de maneira ampla, sem contenção ou reserva. Aqueles que estão na arena pública devem se expor ao permanente escrutínio dos cidadãos para que o ofício de governo, que é tão nobre, possa ser exercido sem desvios."

Mello destacou que a Constituição "instituiu veto permanente a qualquer ensaio de intervenção estatal na esfera das liberdades". Ele recomenda: "Basta a leitura do artigo 220 para verificar que o legislador constituinte exprimiu a hostilidade do ordenamento constitucional a qualquer forma de embaraço à plena liberdade de informação jornalística e proibiu censura política, ideológica e artística."

"A censura representa a própria antítese dos grandes princípios que dão sustentação ao regime democrático", alerta o ministro. "A gente sente e nota que ainda existe dentro do sistema institucional brasileiro núcleos ou bolsões que guardam resíduo de autoritarismo. Imprensa livre é condição fundamental para uma sociedade se proteger contra qualquer forma de opressão estatal. Ato de censura constitui manifestação inqualificável de desrespeito e de transgressão às liberdades fundamentais. E tão preocupante quanto à censura do Executivo é aquela revelada em decisões judiciais."




O QUE DISSERAM


Tarso Genro
Ministro da Justiça
"Tendo em vista as informações já divulgadas sobre aqueles episódios é possível dizer, agora, que o ato já se configura
como uma censura discriminatória e unilateral"



Carlos Ayres Britto
Ministro do STF
"Não pode haver censura prévia. Nenhum juiz pode fazer isso. Não existe meia liberdade de imprensa, assim como não há mulher mais ou menos grávida"



José Álvaro Moisés
Cientista político
"Não há sentido democrático em criar obstáculos a um órgão de imprensa que obtém informações por uma fonte confiável, segura, que são de interesse público"


Odilon Wagner
Ator e diretor
"Essa censura é uma coisa absolutamente vergonhosa. Eu me sinto envergonhado de viver neste país depois de tantos anos de luta pela liberdade"



Cezar Britto
Presidente da OAB
"A persistência da censura
ao jornal e a morosidade
do Judiciário em fazer valer
um preceito constitucional preocupam"




Carlos Melo
Cientista político
"Censurar a imprensa me parece
culpar o termômetro pela febre. Quem deveria estar sendo interpelado por isso não é o jornal, e sim a Polícia Federal"





Walter Maierovitch
Jurista
"É inadmissível que não tenhamos um instrumento que garanta a via direta ao STF em episódios como esse que atinge o Estadão"


Cris Couto
Atriz
"Para mim que vi tudo o que o Sarney fez é complicado achar que está tudo bem. Todos conchavados. Tenho uma vergonha enorme"


O Estado de São Paulo