*Augusto Bezerra
Após a fusão do Itaú com o Unibanco o posto de principal potência do sistema bancário brasileiro deixou de ser do Banco do Brasil. Com a comemorada união desses dois mega-bancos, o Brasil passou a ter uma instituição bancária privada gigantesca, com poder financeiro para concorrer com os grandes conglomerados bancários internacionais.
Desde então, o Banco do Brasil, com o aval do Governo Federal, tem buscado “crescer” no mercado através da aquisição de outras instituições. O presidente Lula editou até mesmo a Medida Provisória nº. 443, autorizando Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal a comprar participações em outras instituições bancárias. Esse processo de crescimento orgânico do Banco do Brasil tem sido alardeado pela imprensa já há algum tempo.
Em 10 de março passado, a coluna “Panorama Político”, do Jornal “O Globo” noticiou que “quando o governo Lula chegar ao seu final, em 2010, é possível que nenhum banco público estadual sobreviva. O Banco do Brasil já adquiriu o Besc (Santa Catarina), o BEP (Piauí) e a Nossa Caixa (São Paulo). Agora está negociando o preço da compra do BRB (Brasília) e realizando auditoria para definir o valor do Banestes (Espírito Santo). Os próximos alvos do BB são o Banpará (Pará) e o Banese (Sergipe). O caso do Banrisul (Rio Grande do Sul) é o mais complicado, pois será preciso mudar a Constituição estadual. Mas no BB se avalia que a compra da Nossa Caixa abriu uma janela ideológica para viabilizar o negócio?. Diante dessa notícia, buscamos no texto da Constituição do Rio Grande do Sul a forma encontrada naquele Estado para proteger e resguardar um sólido patrimônio do povo gaúcho. Descobrimos que o parágrafo segundo do art. 22 da Constituição daquele Estado exige que “especialmente no caso das Sociedades de Economia Mista Banco do Estado do Rio Grande do Sul S.A. e Companhia Riograndense de Saneamento a alienação ou transferência do seu controle acionário, bem como a sua extinção, fusão, incorporação ou cisão dependerá de consulta popular, sob a forma de plebiscito”. Tal dispositivo foi acrescentado à Carta Política do Rio Grande do Sul por obra da Emenda Constitucional nº. 31, de 18/06/02.
Pois bem, em 12 de março, ocupando a tribuna da Assembléia Legislativa do Estado de Sergipe, relatei a minha preocupação com uma futura, e provável, venda do Banese, um dos maiores patrimônios dos sergipanos. Logo em seguida, comuniquei aquele Parlamento que apresentaria proposta de emenda à Constituição de Sergipe com o intuito de acrescentar o parágrafo nono ao art. 25 do nosso texto constitucional, com a seguinte redação: ?Especialmente no caso da Sociedade de Economia Mista Banco do Estado de Sergipe S.A. a alienação ou transferência do seu controle acionário, bem como a sua extinção, fusão, incorporação ou cisão dependerá de consulta popular, sob a forma de plebiscito?.
Diante da surpresa, o bloco que representa o governo na Assembléia Legislativa manteve-se absolutamente inerte naquela sessão.
Passados mais de vinte dias da notícia da proposta, já contando a mesma com o mínimo de assinaturas para apresentação à nossa Casa Legislativa, percebe-se um movimento, arquitetado nos porões do Palácio de Despachos da Avenida Adélia Franco, tentando minar e desacreditar a proposta, evitando que a mesma seja levada ao voto dos nossos deputados estaduais. Esse movimento, que tem seus peões de batalha nas pessoas do deputado Francisco Gualberto (líder do Governo), deputado Gilmar Carvalho (suplente de deputado que precisa agradar diariamente a todos os gostos do governador Marcelo Déda) e o jornalista Cláudio Nunes (que há muito vem demonstrando não ter compromisso com a imparcialidade jornalística quando o assunto envolve interesse do governador). Usando da mesma prática petista ao enfrentar o escândalo do Mensalão, os três têm procurado desacreditar a nossa proposta, como forma de evitar o real cerne do debate, ou seja, se o Banese poderá ser vendido e o que podemos fazer para proteger esse patrimônio público. Procurarei refutar os argumentos de cada um.
O deputado Francisco Gualberto alegou que não assinará a proposta de emenda constitucional, apesar de garantir que não é contra uma emenda que proteja o Banese. Segundo ele, ?quando se apresenta uma emenda desta, estão é fazendo publicidade da venda que não existe. É admitindo para a sociedade a possibilidade, criando dúvidas para o povo. Claro está que a lógica do líder governista é confundir para enganar. Mesmo garantindo que o governador Marcelo Déda não admite a possibilidade de venda do Banese, alega que o apoio ao projeto de emenda constitucional criaria essa possibilidade. Discurso sem compromisso.
Ora, se o governo não trabalha com a hipótese de venda do banco estadual, por que não apoiar a proposta que apresentamos e garantir que o Banese não será vendido, seja neste ou em outros governos? A resposta está na concreta possibilidade do Banco do Brasil realmente desejar adquirir o Banese, o que teria apoio do presidente Lula, e que, por conseguinte, faria o governador Marcelo Déda não esboçar a mínima reação à venda. O governador já demonstrou não ter coragem de opor-se aos interesses do presidente da República. Homem inteligente que é, sabe dos prejuízos da transposição do Rio São Francisco ao nosso Estado, mas jamais proferiu qualquer palavra contra esta obra, que trará conseqüências nefastas ao nosso povo. Entre os interesses dos sergipanos e do compadre-presidente, Marcelo Déda já externou para que lado pende sua balança.
Se o deputado Francisco Gualberto teme nos dar publicidade com a aprovação da emenda e se garante que o governador não venderia o Banese, proponho-lhe que a proposta de emenda constitucional seja de autoria coletiva dos deputados e, após aprovada no plenário da Assembléia Legislativa, assumo o compromisso de não me utilizar desse fato em futuras campanhas políticas. Será que o deputado aceitaria? Lanço o desafio.
O deputado Gilmar Carvalho, talvez enciumado e ao mesmo tempo constrangido por não poder apoiar a emenda, tentou desqualificar a nossa proposta de maneira rancorosa e vil. Ao citar uma proposta de emenda constitucional que visava tão-somente atrapalhar pontos da reforma administrativa do então governador João Alves Filho, o deputado Gilmar Carvalho ressente-se provavelmente da ordem recebida de atacar a qualquer custo a proposta que apresentamos. Dessa vez ele não poderá estar ao lado dos baneseanos diante do comando que recebeu do seu patrão político.
A nossa postura em relação à então proposta do deputado Gilmar Carvalho e o nosso entendimento atual, que cominou com a apresentação da citada proposta de emenda constitucional, pauta-se sempre na realidade enfrentada e vivenciada no mundo político. Àquela época o então governador João Alves tentava conduzir a máquina pública estadual a uma feição mais moderna, a proposta apresentada pelo deputado Gilmar Carvalho tinha um só propósito, atrapalhar os trabalhos do Executivo, como foi pautado todo o mandato anterior do deputado. Talvez por ter tal percepção que o povo de Sergipe não lhe conferiu um novo mandato. A realidade agora é outra, estamos diante de um quadro do sistema bancário onde o Banco do Brasil vorazmente adquire outras instituições bancárias com o objetivo de retomar o posto histórico de maior banco brasileiro. É diante de tão grave ameaça à perpetuação do Banco do Estado de Sergipe que a proposta que apresentamos deve vingar.
Circunstâncias políticas e econômicas mudam. Não podemos ficar inertes, com pensamentos ideológicos fixos e imutáveis. Como seres políticos que somos, devemos acompanhar as mudanças e avanços da sociedade, da economia e da própria política Essa dialética sempre existiu e continuará a existir. É da natureza humana. Vejamos os antigos sindicalistas e comunistas de Sergipe, hoje me parecem completamente adaptados à nova realidade que vivem, desfrutando aos olhos de todos prazeres que um dia chamaram de burgueses e fúteis. Quem não já ouviu falar em Aracaju do intenso gosto de expoentes do governo estadual e da Prefeitura de Aracaju pelos bons (e caros) prazeres de Baco?
Por fim, com relação às críticas que nos foram dirigidas pelo jornalista Cláudio Nunes na sua coluna diária, acredito todas já refutadas nesse texto. O gosto do jornalista em defender os interesses do governador Marcelo Déda é perceptível ao mais distraído sergipano. Nesse mister, chega a indagar sobre a função da Assembléia Legislativa, por entender que haveria, com o plebiscito, esvaziamento de funções dos deputados estaduais. Tal lógica externa um completo desconhecimento do processo político constitucional. Como jornalista, deveria primeiro conhecer o tema democracia direta para somente depois tecer seus despropositados comentários. Nova falha profissional, não bastasse o desapego da imparcialidade, o jornalista também passar a tecer seus comentários em total falta de conhecimento do sistema de consulta popular que conhecemos por plebiscito.
Ao propormos que a alienação ou transferência do controle acionário do Banese, bem como a sua extinção, fusão, incorporação ou cisão seja precedida de consulta popular, sob a forma de plebiscito, transferimos a decisão sobre a venda do banco ao povo sergipano. Não há esvaziamento de funções da Assembléia Legislativa do Estado de Sergipe. Como já dissemos na justificação da proposta de emenda constitucional, o projeto confere a necessidade de consulta ao povo sergipano da sua aprovação ou rejeição antes que o governador Marcelo Déda tome decisão que resulte na venda do Banese. O plebiscito é um mecanismo de consulta popular previsto na Constituição Federal de 1988 que resulta numa forma de democracia direta, sendo a forma ideal para discutir um tema tão relevante para o povo sergipano como a venda do Banco do Estado de Sergipe S/A, diante de sua importância histórica no desenvolvimento do nosso Estado. O valor do Banco do Estado para os sergipanos, na economia, na cultura popular e no orgulho do nosso povo, faz valer a discussão na forma do art. 14 da Constituição Federal (plebiscito).
Esquece-se o nobre jornalista que a Constituição do Estado de Sergipe dispõe em seu art. 1º, § 1º, que todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição (vide art. 47, XX, da CE/SE), essa é a hipótese que obrigatoriamente nosso povo deve ser consultado, manifestando a soberana decisão popular acerca do patrimônio público constituído pelo Banco do Estado de Sergipe S/A.
Por todas essas razões é que entendemos que o debate sobre a necessidade de proteção jurídica do Banese deve ser feita de forma pública e elevada, onde o governador Marcelo Déda externe seu entendimento sobre o tema, apoiando ou rejeitando a idéia, bem como os membros do seu grupamento político. Tão importante tema não pode ser objeto de ataques elaborados nos porões do governo com o intuito único de desqualificar nossa proposta e afastar da sociedade o debate sobre essa matéria. Os sergipanos precisam saber a opinião dos seus homens públicos sobre a venda do Banese. A garantia dada pelo líder do governo que esse patrimônio do povo de Sergipe não será vendido de nada servirá quando numa manhã o compadre-presidente fizer uma ligação ao Palácio de Despachos e disser roucamente do outro lado da linha: “Déda, autorizei o Banco do Brasil a comprar o seu Banese, tudo ok”.... “Tudo certo meu compadre!”.
*Augusto Bezerra é deputado estadual em Sergipe