Candidatos selecionados em concursos conseguem notas exigidas mas não são chamados devido ao corte de verbas no orçamento da União. Na Câmara dos Deputados, 212 cargos foram liberados para nomeação, mas só 32 servidores tomaram posse.
SERVIÇO PÚBLICO
170 mil na torcida
De olho em uma vaga no governo federal, brasileiros fazem concursos, conseguem as notas exigidas, mas não são chamados. Ministério do Planejamento adia convocação por causa do corte de verbas
Cadu Gomes/CB/D.A Press
Letícia Nobre
Da equipe do Correio
O corte de R$ 21 bilhões no orçamento público do governo federal deste ano despejou um balde de água fria nos concurseiros. Apesar de não cancelar ou suspender os concursos, a bomba estourou no colo das nomeações. As despesas com pessoal e encargos sociais vão cair R$ 1,066 bilhão e, para fechar a conta, convocações serão adiadas e as autorizações passarão por um pente fino. O Correio levantou que, só nos principais concursos federais, mais de 170 mil candidatos aprovados têm a expectativa de serem nomeados. São profissionais aptos a preencherem mais de 6,9 mil vagas em muitos ministérios e órgãos estratégicos.
Na versão original, a Lei Orçamentária sancionada no último dia de 2008 previa um teto de gastos de R$ 1,798 bilhão para a criação e provimento de cargos e funções. O montante poderia ser usado para preencher quase 64 mil vagas. Agora, as únicas fatias que estão a salvo são os postos de substituição de terceirizados, que totalizam 19.423 vagas. “Não podemos mexer na substituição dos terceirizados. Temos que cumprir o prazo judicial. Além do mais, eles vão criar uma despesa e eliminar outra”, diz Marcelo Viana, secretário de gestão do Ministério do Planejamento. O acordo para trocar contratados temporários irregulares por efetivos de carreira foi acertado em 2007 no Ministério Público do Trabalho. No Termo de Ajustamento de Conduta, todos devem ser substituídos até o fim de 2010.
Apreensão
Os 692 aprovados às 212 vagas da Câmara dos Deputados são exemplos de concurseiros angustiados. Praticamente, todos os cargos foram liberados para nomeação, mas só 32 servidores tomaram posse. A seleção teve início em 2007 e protagonizou diversos questionamentos judiciais ao longo de 2008. “Quando, enfim, o concurso é homologado aparece mais esse problema”, lamenta Giovana Perlin, 37 anos, aprovada para a área de recursos humanos. Assim como ela, os arquivistas Marcelo Fontora, 46, e Bruno Menezes, 27, aguardam pacientemente para tomar posse. “Estou trabalhando e todos os dias me perguntam quando vou mudar de emprego”, diz Fontora. Segundo Bruno, as empresas não investem no empregado porque sabem que, a qualquer momento, ele não estará em seu quadro funcional.
Outros aprovados têm casos mais preocupantes: estão desempregados e vivendo da expectativa de nomeação. “São pessoas que estão entre os classificados, dentro do número de vagas e não sabem mais o que fazer”, conta Mariana Oliveira, 27, futura assistente administrativa da Câmara. A nutricionista Márcia Pontes, 44, admite que fechou o consultório que tinha e vive de trabalhos temporários. Da mesma forma, a odontóloga Mariana Soares, 28, largou o consultório e aguarda a chamada para o cargo de policial legislativo.
Panos quentes
O secretário do Planejamento admite que a máquina pública brasileira suporta os novos servidores. Segundo ele, depois de um longo período de declínio, o país atingiu o mesmo patamar de 1997 no quantitativo de funcionários públicos. Os concursos, acrescenta ele, estão recuperando a força de trabalho perdida em razão de aposentadorias, evasões e ampliação natural das demandas dos órgãos. Há 12 anos, eram 531.725 servidores civis ativos. Em 2008, esse número passou para 538.797.
A preocupação dos candidatos é amortecida por Marcelo Viana. “Não há motivo para desespero. Só estamos cautelosos, como todo o mercado de trabalho”, afirma. Ele acrescenta que o governo não agirá de maneira irresponsável. “Cada caso está sendo visto com cuidado, de acordo com as áreas de prioridade. Além do mais, o peso da folha não está nesse ingresso, que é marginal, está no estoque. Não é aí que vamos resolver o problema fiscal.”
O secretário explica ainda que o mapa de impacto tem uma particularidade: quase metade dos aprovados nos concursos federais é de pessoas de dentro do governo, mas não é assim que as contas são feitas. “No cálculo dos custos, consideramos que todos são externos. O que na realidade não acontece. Jogamos a conta para cima para evitar desfalques”, diz.
As autorizações — 5.711 feitas só em 2009 — serão dadas com mais cautela. concursos muito esperados, como os da Receita Federal, Polícia Federal, Polícia Rodoviária e Banco Central estão percorrendo os corredores do Planejamento sem previsão de sinal verde. “Receita e BC estão com negociações bem adiantadas”, limita-se a comentar Viana. “As permissões para novos concursos serão feitas com cuidado para evitar impasses futuros. É na autorização que ponderamos, reduzimos vagas, dividimos a permissão. Nas nomeações, há mais espaço para chegar a um acordo”, frisa.
CORREIO BRAZILIENSE