Folha de São Paulo
Decisão terá repercussão sobre ações contra 6 governadores ameaçados de perder cargo
Tendência é de uma decisão apertada, pois há ministros incomodados com o fato de derrotados na urna obterem mandatos pela via judicial
O STF (Supremo Tribunal Federal) deve julgar ainda neste semestre a legalidade da interpretação do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) que conduz segundos colocados nas eleições aos cargos de governadores e prefeitos cassados, em vez de determinar a realização de novos pleitos para definir os titulares dos mandatos.
A decisão do STF terá repercussão sobre processos contra seis governadores ameaçados de cassação pelo TSE. O entendimento aplicado pela corte já promoveu a substituição dos governadores da Paraíba -José Maranhão (PMDB) no lugar de Cássio Cunha Lima (PSDB)- e do Maranhão -Roseana Sarney (PMDB) no posto que era de Jackson Lago (PDT).
O processo sobre a questão ganhou impulso na última quarta-feira, quando o procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, emitiu seu parecer na causa, favorável ao entendimento do TSE.
A tendência é de uma decisão apertada no STF sobre o tema, que envolve a discussão sobre a aplicação do princípio da maioria, presente na Constituição.
Alguns ministros do STF afirmam estar incomodados com o fato de candidatos rejeitados nas urnas conseguirem mandatos pela via judicial.
Porém, 3 dos 11 ministros do STF também são integrantes do TSE e dificilmente irão votar contra a atual interpretação da corte eleitoral.
O presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, tem a expectativa de que o julgamento sobre o assunto ocorra ainda neste semestre. Mendes já chegou a conversar sobre isso com o ministro Ricardo Lewandowski, relator de um dos processos que envolvem a questão.
Em sabatina da Folha, em março, Mendes afirmou que não poderia falar sobre os casos em trâmite no STF, mas disse que "a intervenção da Justiça Eleitoral deveria ser, tanto quanto possível, minimalista e preventiva, para não alterar o resultado eleitoral, porque muitas vezes há o abuso do abuso. Muitas vezes temos o processo do primeiro lugar, que é julgado procedente, e temos também em tramitação o processo do segundo lugar".
O atual mecanismo de preenchimento de cargos de políticos cassados foi definido pelo TSE em dezembro, após uma consulta do Tribunal Regional Eleitoral do Piauí.
O TSE determinou que, após uma cassação, o segundo turno da eleição deve ser desconsiderado. Para definir o vencedor do pleito, passa a valer a votação do primeiro turno, que é recalculada descontando-se os votos do cassado.
A ação em trâmite no STF mais adiantada sobre o assunto é uma ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) do PSDB. Segundo a ação, o entendimento do TSE sobre substituição de cassados, sem novas eleições, viola o princípio constitucional da maioria presente, por exemplo, no artigo 77 da Constituição.
O artigo refere-se ao pleito para a presidência da República e prevê que será eleito "o candidato que (...) obtiver a maioria absoluta de votos, não computados os em branco e os nulos". Esse dispositivo legal também determina a realização de segundo turno, caso nenhum candidato obtenha maioria no primeiro turno.
Segundo a ação, a interpretação do TSE também desrespeita a vontade popular manifestada nas urnas e permite que candidatos rejeitados nas eleições cheguem ao poder.
No seu parecer no caso, o procurador-geral afirma que o entendimento do TSE não viola o princípio da maioria. "Não é a pura soma de votos que deva significar a escolha democrática de um governante. Pensado assim, o conceito de maioria teria que ignorar as objeções que temos, satisfatoriamente justificadas, aos votos arrecadados sob influência do poder econômico e político."
Para o presidente do TSE, Carlos Ayres Britto, a solução de preencher os cargos dos cassados a partir da consideração dos votos dos outros candidatos no primeiro turno concilia o princípio da maioria com o da legitimidade em eleições limpas. (FLÁVIO FERREIRA)