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Augusto Maynard


CANHÕES E TRINCHEIRAS NA PRAIA FORMOSA

José Anderson Nascimento *

Na madrugada de 13 de julho de 1924, a cidade do Aracaju era sacudida por cruento tiroteio, alimentado pelo matraquear das metralhadoras do 28º Batalhão de Caçadores, cuja corporação havia sido sublevada pelo capitão Eurípedes Esteves de Lima e tenentes Augusto Maynard Gomes, João Soarino de Melo e Manuel Messias de Mendonça, para apoiar a Revolução Paulista de 1924, que havia estourado na cidade de São Paulo, a 5 de julho, sob a liderança do general Isidoro Dias Lopes, major Miguel Costa, João Cabanas e Joaquim Távora, contra o Presidente da República, Artur da Silva Bernardes. O objetivo desse movimento de oposição a Bernardes, era pôr fim à oligarquia do Partido Republicano Paulista e Partido Republicano Mineiro, que impunham sempre em seus conchavos os presidentes, impedindo assim que se manifestasse livremente o desejo do povo na escolha do Chefe da Nação.
Crises militares foram uma constante na primeira fase da República, mas, a partir de 1922, elas ganhariam um novo protagonista: a oficialidade de baixa patente, de que decorreu a denominação "Tenentismo". Encarnando as aspirações da classe média urbana, esses revolucionários pugnavam pela adoção do voto livre e secreto e pela moralização dos costumes políticos.
O primeiro levante tenentista teve lugar no final do governo do Presidente Epitácio Pessoa, com a Revolta do Forte de Copacabana. Enfrentando uma grave crise militar, provocada pela publicação na imprensa de cartas ofensivas às Forças Armadas, atribuídas ao candidato Artur Bernardes, Epitácio Pessoa determinou o fechamento do Clube Militar e a prisão do seu presidente, Hermes da Fonseca. Dois meses depois, a 5 de julho de 1922, revoltaram-se as guarnições dos fortes do Vigia e de Copacabana, neste último sob o comando do capitão Euclides Hermes da Fonseca, filho do ex-presidente. A revolta, contornada em dois dias, não teria maiores conseqüências, não fosse o episódio dos Dezoito do Forte de Copacabana, quando o tenente Antônio Siqueira Campos e dezesseis companheiros negaram-se a capitular e marcharam para a praia, onde receberam a adesão do civil Otávio Correia. Ali, enfrentaram sozinhos as tropas do governo. No combate, morreram os tenentes Nilton Prado e Mário Carpenter e o civil Otávio Correia.
A Revolta de 13 de Julho, associada ao 5 de Julho, marca o inicio do movimento tenentista em Sergipe. Os revoltosos atacaram o Palácio do Governo, que foi defendido pelo tenente Stanley Fernandes da Silveira. Na luta, morreu o soldado José Martins de Castro e saíram feridos o cabo Marcílio Cordeiro Santa Bárbara e o soldado Manuel Inácio Teles. No ataque ao Quartel da Policia Militar, situado na antiga Rua da Frente, hoje Ivo do Prado, onde funciona a Secretaria da Educação, morreu o soldado José Rodrigues de Oliveira e muitos ficaram feridos. O Telégrafo Nacional e a Estação Ferroviária, esta última, localizada nas proximidades do Mercado Thales Ferraz, foram ocupados simultaneamente. Recolhiam-se presos ao Quartel do 28º Batalhão de Caçadores, então, localizado na atual Praça General Valadão, onde, hoje, está edificado o antigo Hotel Pálace de Aracaju, os oficiais que não aderiram ao movimento, a começar pelo seu Comandante, Major Jacinto Dias Ribeiro, capitães Augusto Pereira, Misael Mendonça e Galdino Ferreira Martins e os tenentes Heráclito d'Ávila Garcez, Antenor Cabral, João Batista de Matos e José Figueiredo Lobo, filho do ex-Presidente do Estado de Sergipe, José Joaquim Pereira Lobo.
Na mesma madrugada era também preso o Chefe de Polícia, Ciro Cordeiro de Farias, e a resistência do governo estadual ficava fraca e acéfala, tendo os revoltosos ocupado todos os pontos estratégicos da capital.
No dia seguinte, o Presidente (Governador) do Estado, Dr. Maurício Graco Cardoso, era preso e recolhido ao Quartel do 28º BC, juntamente com alguns auxiliares do primeiro escalão, entre eles o Dr. Hunald Santaflor Cardoso e o Secretário Gera1 do Governo, Dr. Carlos Alberto Rolla. O governante ficou incomunicável enquanto durou a Revolta.
Formada a Junta Governativa, logo passou-se à convocação de reservista e de voluntários. Aracaju estava em pé de guerra. Enorme era o aparato bélico nas suas ruas e areais.
Preocupados com um possível desembarque de tropas contrárias pelo mar, os revoltosos cuidaram logo de minar a barra do Rio Sergipe e de estacionar o canhão SERGIPE, nas brancas areias da Praia Formosa, voltado para o canal. Ali, também, colocaram mais dois canhões, um denominado de UNIÃO FAZ A FORÇA e o outro conhecido por 42, mortífera arma alemã da Guerra de 1914. Na Praia Formosa cavaram várias trincheiras e levantaram barricadas com sacos de areia.
A resistência à possível reação dos bernardescos não ficou só em Aracaju. O tenente Maynard deslocou tropas para a Vila do Carmo, atual Carmopólis, ao Norte, visando conter o Batalhão Hercilio Brito, que marchava contra as suas posições com mais de 80 homens em armas e muitos cangaceiros procedentes do Baixo São Francisco. Tropas de Maynard foram ainda enviadas para São Cristóvão e Itaporanga D'Ájuda, ao Sul. Sabia-se, outrossim, que partia de Simão Dias uma coluna comandada pelo coronel Pedro Freire de Carvalho, objetivando defender o Presidente c Estado, em poder dos revoltosos.
Em Salvador, o general Marçal Nonato de Faria era encarregado pelo Governo Federal de restabelecer a ordem em Sergipe, sufocando a Revolta e reconduzindo ao Governo o Dr Graco Cardoso. Para essa tarefa contou com mais de mil homens, procedentes de várias unidades militares, a começar pelo 20º BC, de Alagoas; 21º BC, de Pernambuco e 22º BC, da Paraíba. Contou, mais, com soldados das Policias Militares da Bahia e de Alagoas, além do Batalhão Hercilio Brito.
Na verdade, só os revoltosos do 28º BC cumpriram o articulado com os seus camaradas paulistas. Em São Paulo, o Governo Federal reagiu logo, bombardeando a cidade às cegas, atingindo civis e residências. No final de julho o cornando revolucionário evacuou a cidade, dirigindo-se parte de suas tropas para o sul onde se juntou às forças do capitão Luís Carlos Prestes, e parte para Catanduva, onde ainda houve uma resistência por alguns meses.
As tropas de Prestes haviam surgido no Rio Grande do Sul, como decorrência da Revolução de 1924. Quando se uniram à Coluna Paulista, formaram um novo destacamento revolucionário, a Coluna Prestes,' que por quase três anos percorreu 36.000 km pelo interior do Brasil, através de quase todos os Estados, divulgando o programa revolucionário do tenentismo e travando uma série de combates com as forças do governo.
O restabelecimento da ordem legal em Sergipe tornava-se, contudo, missão espinhosa para o general Marçal Nonato, desde quando te ria que cumpri-la sem derramamento de sangue e sem negociar condições de rendição com os revoltosos.
Por outro lado, o capitão Euripedes Esteves de Lima, em nome da Junta Governativa, anunciava às autoridades e ao povo em geral que os revoltosos estavam preparados para reagir a qualquer provocação ou afronta. Dizia, mesmo, que a deposição do Dr. Graco Cardoso não se prendia à política estadual, absolutamente. Atendia, isso sim, a movimento revolucionário.
O primeiro choque das revoltosos com o Batalhão Hercilio Brito aconteceu nos arredores de Carmopolis e os ribeirinhos fugiram desesperados ao primeiro tiro de um velho canhão.
No Rio de janeiro o Congresso Nacional decretava no dia 14 de julho o estado de sitio sobre São Paulo, que se estendia aos Estados de Sergipe e Bahia.
Respaldado com instrumentos legais, o general Marçal
nato montou a operação para restabelecer a legalidade em Sergipe. Seria uma campanha conjunta de mar e terra. Para isso contou com navios da Marinha de Guerra e locomotivas da Ferrovia Leste Brasileiro.
Devido às dificuldades ao desembarque que teriam as tropas legalistas na Praia Formosa, o executor do sitio em Sergipe preferiu desembarcá-las nas praias da Estancia.
Com efeito, no dia 24 de julho, por cerca das 10 horas, os navios Comandante Miranda, Iris, Maraú e Canavieiras singravam as águas do Rio Real e Piauí, desembarcando as tropas e os equipamentos no Crasto, em Santa Luzia do Itanhy. Defronte da praia do Mangue Seco, ficando ao largo o contra-torpedeiro Alagoas.
O cerco aos revoltosos apertava. O general Nonato proclamava a 25 de julho, na Estancia, que todos os atos praticados pela Junta Governativa estavam nulos. Adiantava que até o momento do restabelecimento da ordem constitucional, todas as autoridades deviam-lhe obediência, situação que somente cessaria com a reposição do Dr. Graco Cardoso no Governo do Estado.
Ajustados os primeiros preparativos, a tropa da Policia da Bahia foi unir-se a segmento do Exército em Salgado. Daí partiram para Itaporanga D'Ájuda, onde os revoltosos recuaram para São Cristóvão e, de São Cristóvão recuaram ainda mais para Aracaju, em que a resistência foi efêmera fazendo-os capitular. Em Carmópolis a resistência foi maior, em que pese o porfiado tiroteio que abafou a retaguarda dos tenentes.
A calma somente voltou a reinar em Aracaju a 3 de agosto. Revoltosos eram capturados e levados ao Quartel do 28º Batalhão de Caçadores, outros entregavam-se voluntariamente. O tenente Augusto Maynard, auxiliado pelo amigo Brasiliano de Jesus, conseguiu fugir ao cerco e bateu-se em São Paulo, sendo preso e conduzido à ilha da Trindade, localizada a 1.150 Km a leste do Estado do Espirito Santo, que se havia transformado em prisão militar. Mais de 500 pessoas foram indiciadas em processos criminais, porém os ideais de liberdade permaneceram vivos entre os sergipanos.
Com Maynard, nascia em Sergipe a liderança na luta contra a casagrande e a cana-de-açúcar, na expressão do Professor Artur Fortes.
O coroamento, porém, do movimento tenentista em Sergipe, deu-se com a Revolução de 30 e, principalmente com a nomeação do capitão Augusto Maynard para Interventor Federal no Estado.
E, em sua homenagem, a Praia Formosa transformava-se em "Praia 13 de Julho", pelo Ato nº 11, do Intendente Municipal Camilo Calazans, publicado no Diário Oficial de 28 de novembro de 1930, em que Augusto Maynard Gomes foi reconhecido como o grande líder militar do levante de 13 de Julho de 1924.



Fonte: JOSÉ ANDERSON NASCIMENTO é ocupante da Cadeira nº 20
da Academia Sergipana de Letras.s

 

Gilberto Amado


Gilberto Amado, jornalista, político, diplomata, poeta, ensaísta, cronista, romancista e memorialista, nasceu em Estância, SE, em 7 de maio de 1887, e faleceu no Rio de Janeiro, RJ, em 27 de agosto de 1969. Eleito em 3 de outubro de 1963 para a Cadeira n. 26, na sucessão de Ribeiro Couto, foi recebido em 29 de agosto de 1964, pelo acadêmico Alceu Amoroso Lima.

Era o primeiro dos 14 filhos do casal Melchisedech Amado e Ana Amado. Fez os estudos primários em Itaporanga, também no interior do Sergipe. Depois estudou Farmácia na Bahia e diplomou-se pela Faculdade de Direito de Recife, da qual se tornou, ainda muito moço, catedrático de Direito Penal.

Em 1910, transferiu-se para o Rio de Janeiro, iniciando a sua colaboração na imprensa, no Jornal do Commercio com um estudo sobre Luís Delfino. Passou depois a ocupar uma coluna semanal, em O País. Em 1912, realizou sua primeira viagem à Europa assunto de um de seus livros de memórias e em 1913, como era então a moda, pronunciou, no salão nobre do Jornal do Commercio, a convite da Sociedade dos Homens de Letras, uma conferência em que fez o elogio do espírito contemplativo A chave de Salomão, que no ano seguinte, juntamente com outros escritos, seria publicada em livro.

Em 1915, foi eleito deputado federal por Sergipe. Sua atuação na Câmara se fez sentir, sobretudo, através de discursos que se tornaram famosos, como o que pronunciou na sessão de 11 de dezembro de 1916 sobre "As instituições políticas e o meio social no Brasil". Nos últimos anos da República Velha, exerceu mandato no Senado, até encerrar-se a sua carreira política, com a Revolução de 1930. Em 1931, chamou a atenção do país, e especialmente dos revolucionários de 30, vitoriosos mas indecisos, para problemas de direito político, como os sistemas representativos, a representação proporcional, o sufrágio universal. Depois de um curso de conferências sobre esses temas, publicou Eleição e representação (1932), de viva atualidade ainda hoje. Por essa época, voltou ao magistério superior, na Faculdade de Direito do Distrito Federal, iniciando um novo e fecundo período em sua vida, de estudos e trabalhos.

Em 1934, deu início ao que foi, desde então, a sua atividade permanente: a diplomacia. Foi nomeado consultor jurídico do Ministério das Relações Exteriores, sucedendo a Clóvis Beviláqua. Desse posto passou ao de embaixador, sendo a sua primeira missão junto ao governo do Chile (1936). De 1939 a 1947, foi ministro na Finlândia. A partir de 1948, tornou-se membro da Comissão de Direito Internacional da ONU, sediada em Genebra. Os arquivos do Itamarati guardam os numerosos relatórios, pareceres e teses de Gilberto Amado, documentos da sua contribuição ao estudo do Direito Internacional, durante o período de 28 anos em que integrou essa Comissão. Foi também delegado do Brasil a todas as sessões ordinárias da Assembléia Geral da ONU, desde as primeiras, realizadas ainda em Lake Success, logo depois da assinatura da Carta de São Francisco, até à última a que pôde comparecer, reunida em Nova York em 1968. São de sua autoria publicações que se encontram no Anuário das Nações Unidas, tais como: "Direitos e deveres dos Estados", "Definição da agressão", "Processo arbitral", "Reservas às Convenções multilaterais", e outras.

Afastado do Brasil em missões oficiais no exterior, Gilberto Amado aos poucos foi se tornando, entre nós, figura mítica. Periodicamente vinha ao Brasil, fazendo quase sempre coincidir sua permanência no Rio com o lançamento de um novo livro. Como toda figura mítica, tornou-se conhecido, sobretudo, pelas lendas e anedotas que circulavam a seu respeito, reproduzindo ditos espirituosos e atitudes inusitadas. A carreira de escritor seguiu sempre paralela à do político e do diplomata. Em 1917 publicou os versos de Suave ascensão, lírico intermezzo numa fase de intensas preocupações críticas, filosóficas, jurídicas e sociológicas, que se exprimem em sucessivos ensaios sobre problemas brasileiros. Em 1932, publicou Dança sobre o abismo, em que retorna ao ensaio literário, e, no ano seguinte, Dias e horas de vibração, crônicas de Paris. Surgiu como romancista, em 1941, com Inocentes e culpados e, no ano seguinte, com Os interesses da companhia. Em 1954 iniciou a publicação de sua memórias, com História da minha infância, a que se seguiram mais quatro volumes.

Obras: A chave de Salomão e outros escritos, ensaios (1914); A suave ascensão, poesia (1917); Grão de areia, ensaio (1919); Aparências e realidades, ensaio (1922); Eleição e representação, conferências (1932); Dança sobre o abismo, ensaio (1932); Espírito do nosso tempo, ensaio (1933); Dias e horas de vibração, crônicas (1933); Inocentes e culpados, romance (1941); Os interesses da companhia, romance (1942); Poesias (1954); Assis Chateaubriand, ensaio (1953).

MEMÓRIAS: História da minha infância (1954); Minha formação no Recife (1955); Mocidade no Rio e primeira viagem à Europa (1956); Presença na política (1958); Depois da política (1960).

Fonte: Academia Brasileira de Letras

 


 

Sílvio Romero

Sílvio Romero (S. Vasconcelos da Silveira Ramos R.), crítico, ensaísta, folclorista, polemista, professor e historiador da literatura brasileira, nasceu em Lagarto, SE, em 21 de abril de 1851, e faleceu no Rio de Janeiro, RJ, em 18 de julho de 1914. Convidado a comparecer à sessão de instalação da Academia Brasileira de Letras, em 28 de janeiro de 1827, fundou a Cadeira n. 17, escolhendo como patrono Hipólito da Costa.
Foram seus pais o comerciante português André Ramos Romero e sua mulher Maria Joaquina Vasconcelos da Silveira. Na cidade natal iniciou os estudos primários, cursando a escola mista do professor Badu. Em 1863, partiu para a corte, a fim de fazer os preparatórios no Ateneu Fluminense. Em 68, regressou ao Norte e matriculou-se na Faculdade de Direito do Recife. Formou, ao lado de Tobias Barreto (que cursava o 4o ano quando Sílvio se matriculou no primeiro) e junto com outros moços de então, a Escola do Recife, em que se buscava uma renovação da mentalidade brasileira. Sílvio Romero foi, no início, positivista. Distinguiu-se, porém, dos que formavam o grupo do Rio, onde Miguel Lemos levava o comtismo para o terreno religioso. Espírito mais crítico, Sílvio Romero se afastaria das idéias de Comte para se aproximar da filosofia evolucionista de Herbert Spencer, na busca de métodos objetivos de análise crítica e apreciação do texto literário.

Estava no 2o ano de Direito quando começou a sua atuação jornalística na imprensa pernambucana, publicando a monografia A poesia contemporânea e a sua intuição naturalista. Desde então, manteve a colaboração, ora como ensaísta e crítico, ora como poeta, nas folhas recifenses, entre elas A Crença, que ele próprio dirigia juntamente com Celso de Magalhães, o Americano, o Correio de Pernambucano, o Diário de Pernambuco, o Movimento, o Jornal do Recife, a República e o Liberal.

Assim que se formou, exerceu a promotoria em Estância. Atraído pela política, elegeu-se deputado à Assembléia provincial de Sergipe, em 1874, mas renunciou, logo depois, à cadeira. Regressou a Recife para tentar fazer-se professor de Filosofia no Colégio das Artes. Realizou-se o concurso no ano seguinte e ele foi classificado em primeiro lugar, mas a Congregação resolveu anular o concurso. A seguir, defendeu tese para conquistar o grau de doutor. Nesse concurso Sílvio Romero se ergueu contra a Congregação da Faculdade de Direito do Recife, afirmando que “a metafísica estava morta” e discutindo, com grande vantagem, com professores como Tavares Belfort e Coelho Rodrigues. Abandonou a sala da Faculdade; foi então submetido a processo pela Congregação, atraindo para si a atenção dos intelectuais da época.

Em fins de 1875, transferiu-se para o Rio de Janeiro. Foi para Parati, como juiz municipal, e ali demorou-se dois anos e meio. Em 1878, publicou o livro de versos Cantos do fim do século, mal recebido pela crítica da corte. Depois de publicar Últimos harpejos, em 1883, abandonou as tentativas poéticas. Já fixado no Rio de Janeiro, começou a colaborar em O Repórter, de Lopes Trovão. Ali publicou a sua famosa série de perfis políticos. Em 1880 prestou concurso para a cadeira de Filosofia no Colégio Pedro II, conseguindo-a com a tese Interpretação filosófica dos fatos históricos. Jubilou-se como professor do Internato em 2 de junho de 1910. Fez parte também do corpo docente da Faculdade Livre de Direito e da Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais do Rio de Janeiro.

No governo de Campos Sales, foi deputado provincial e depois federal pelo Estado de Sergipe. Nesse último mandato, foi escolhido relator da Comissão dos 21 do Código Civil e defendeu, então, muitas de suas idéias filosóficas.

Na imprensa do Rio de Janeiro Sílvio Romero tornou-se literariamente poderoso. Admirador incondicional de Tobias Barreto, nunca deixou de colocá-lo acima de Castro Alves; além disso, manteve, durante algum tempo, uma certa má vontade para com a obra de Machado de Assis. Sua crítica injusta motivou Lafayette Rodrigues Pereira a escrever a defesa de Machado de Assis, sob o título Vindiciae. O Sr. Sílvio Romero crítico e filósofo. Como polemista deve-se mencionar ainda a sua permanente luta com José Veríssimo, de quem o separavam fortes divergências de doutrina, método, temperamento, e com quem discutiu violentamente. Nesse âmbito, reuniu as suas polêmicas na obra Zeverissimações ineptas da crítica (1909).

Sílvio Romero foi um pesquisador bibliográfico sério e minucioso. Preocupou-se sobretudo com o levantamento sociológico em torno de autor e obra. Sua força estava nas idéias de âmbito geral e no profundo sentido de brasilidade que imprimia em tudo que escrevia. A sua contribuição à historiografia literária brasileira é uma das mais importantes de seu tempo.

Era membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, sócio correspondente da Academia das Ciências de Lisboa e de diversas outras associações literárias.

Obras: Cantos do fim do século, poesia (1878); A filosofia no Brasil, ensaio (1878); Interpretação filosófica dos fatos históricos, tese (1880); Introdução à história da literatura brasileira (1882); O naturalismo em literatura (1882); Últimos harpejos, poesia (1883); Estudos de literatura contemporânea (1885); Contos populares do Brasil (1885); Estudos sobre a poesia popular do Brasil (1888); Etnografia brasileira (1888); História da literatura brasileira, 2 vols. (1888; 2a ed. 1902; 3a ed. 1943, organização e prefácio de Nélson Romero, 5 vols.); A filosofia e o ensino secundário (1889); A história do Brasil ensinada pela biografia de seus heróis, didática (1890); Parlamentarismo e presidencialismo na República Cartas ao conselheiro Rui Barbosa (1893); Ensaios de Filosofia do Direito (1895); Machado de Assis (1897); Novos estudos de literatura contemporânea (1898); Ensaios de sociologia e literatura (1901); Martins Pena (1901); Parnaso sergipano, 2 vols.: 1500-1900 e 1899-1904 (1904); Evolução do lirismo brasileiro (1905); Evolução da literatura brasileira (1905); Compêndio de história da literatura brasileira, em colaboração com João Ribeiro (1906); Discurso recebendo Euclides da Cunha na ABL (1907); Zeverissimações ineptas da crítica (1909); Da crítica e sua exata definição (1909); Provocações e debates (1910); Quadro sintético da evolução dos gêneros na literatura brasileira (1911); Minhas contradições, com prefácio de Almáquio Dinis (1914); Trechos escolhidos, seleção e prefácio de Nelson Romero (Nossos clássicos, 25; 1959); Sílvio Romero: teoria, crítica e história literária, com introdução de Antônio Cândido (1978).

Fonte: Academia Brasileira de Letras


 



 

Tobias Barreto


Tobias Barreto de Meneses nasceu na vila sergipana de Campos, a 7 de junho de 1839, sendo filho de Pedro Barreto de Meneses, escrivão de órfãos e ausentas da localidade. É o patrono da Cadeira nº 38 da Academia Brasileira de Letras.

Aprendeu as primeiras letras com o professor Manuel Joaquim de Oliveira Campos. Estudou latim com o padre Domingos Quirino, dedicando-se com tal aproveitamento que, em breve, iria ensinar a matéria em Itabaiana.

Em 1861 seguiu para a Bahia com a intenção de freqüentar um seminário mas, sem vocação firme, desistiu de imediato. Sem ter prestado exames preparatórios voltou à sua vila donde sairá com destino a Pernambuco. Em 1854 e 1865 o jovem Tobias, para sobreviver, deu aulas particulares de diversas matérias. Na ocasião prestou concurso para a cadeira de latim no Ginásio Pernambucano, sem conseguir, contudo, a desejada nomeação.

Em 1867 disputou a vaga de Filosofia no referido estabelecimento. Venceu o prélio em primeiro lugar, mas é preterido mais uma vez por outro candidato.

Para ocupar o tempo entrega-se com afinco à leitura dos evolucionistas estrangeiros, sobretudo o alemão Ernest Haeckel que se tornaria um dos mais famosos cientistas da época com seus livros "Os Enigmas do Universo" e "As Maravilhas da Vida".

No campo das produções poéticas passou Tobias a competir com o poeta baiano Antônio de Castro Alves, a quem superava, contudo, no lastro cultural.

O fato de ser mestiço prejudicou-lhe a vida amorosa numa época cheia de preconceitos, conforme testemunho de Sílvio Romero.

Na oratória Tobias se revelava um mestre, qualquer que fosse o tema escolhido para debate. O estudo da Filosofia empolgava o sergipano que nos jornais universitários publicou "Tomás de Aquino", "Teologia e Teodicéia não são ciências", "Jules Simon", etc.

Ainda antes de concluir o curso de Direito casou-se com a filha de um coronel do interior, proprietário de engenhos no município de Escada.

Eleito para a Assembléia Provincial não conseguiu progredir na política local.

Dedicou vários anos a aprofundar-se no estudo do alemão, para poder ler no original alguns dos ensaístas germânicos, à frente deles Ernest Haeckel e Ludwig Büchner". Conta Hermes Lima, em sua magnífica biografia de Tobias, que ele "para irritar o burguês, com uma nota mais ostensiva de superioridade, abria freqüentemente seu luminoso leque de pavão: o germanismo". Foi em alemão que Tobias redigiu o "Deutscher Kampfer" (O lutador alemão). Mais tarde sairiam de sua pena os "Estudos Alemães".

A residência em Escada durou cerca de dez anos. Ao voltar ao Recife, aos escassos proventos que recebia juntaram-se os problemas de saúde que acabaram por impedí-lo de sair de casa.

Tentou uma viagem à Europa para restabelecer-se fisicamente. Faltavam-lhe os recursos financeiros para isso. Em Recife abriram-se subscrições para ajudá-lo a custear-lhe as despesas.

Em 1889 estava praticamente desesperado. Uma semana antes de morrer enviou uma carta a Sílvio Romero solicitando, angustiosamente, que lhe enviasse o dinheiro das contribuições que haviam sido feitas até 19 de junho daquele ano. Sete dias mais tarde falecia, hospedado na casa de um amigo.

A obra de Tobias é de significativo valor, levando em conta que o professor sergipano não chegou a conhecer a capital do Império.

Suas "Obras Completas", editadas pelo Instituto Nacional do Livro, incluem os seguintes títulos: "Ensaios e Estudos de Filosofia e Crítica", 1875. "Brasilien, wie es ist", 1876. "Ensaio de pré-história da literatura alemã". "Filosofia e Crítica". "Estudos Alemães", 1879. "Dias e Noites", 1881. "Polêmicas", 1901. "Discursos", 1887. "Menores e Loucos", 1884.

Hermes Lima, ao comentar o refúgio de Tobias Barreto em Escada, esclareceu: "Em Escada, além de publicar o "Fundamento do Direito de Punir", erige o germanismo em caminho de cultura. É onde aprofunda seu Haeckel, onde elabora sua posição filosófica, onde traça as coordenadas da revolução espiritual que viria a deflagrar-se no país".

Fonte: Academia Brasileira de Letras

 

 

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