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A águia do imperialismo abre as asas sobre nós (II)

2/2/2009

O Dicionário de Política, de Norberto Bobbio (Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino), define o imperialismo como a “expansão violenta por parte dos Estados, ou de sistemas políticos análogos, da área territorial da sua influência ou poder direto, e formas de exploração econômica em prejuízo dos Estados ou povos subjugados”. O termo originalmente está associado ao império inglês e se considera que a Alemanha, a Itália e o Japão foram imperialistas nos anos 30, 40. A mesma obra acrescenta que, depois de 1945, quando se apagou o impulso imperialista desses Estados, “o fenômeno do imperialismo continuou a manifestar-se (...) na política neocolonialista praticada principalmente pelos Estados Unidos”.

“Os imperialistas são os parasitas do patriotismo... nunca perdem de vista as oportunidades de negócios lucrativos”, já observava, no começo do século passado, o economista inglês John Atkinson Hobson, autor do clássico “Imperialismo: um estudo” (1902) e um dos primeiros a pesquisar o tema: na transformação capitalista, os mercados internos já não bastam e se tornam necessários os mercados externos para a absorção da produção, mercados que se conquistam com a conquista das colônias. Buscando explicar a rivalidade inter-imperialista entre as grandes potências, na busca por mais mercados que conduzira à Primeira Guerra Mundial, Vladimir Lênin, na obra “Imperialismo, estágio superior do capitalismo” (1916), afirma que “o imperialismo é o estágio monopolista do capitalismo”. De acordo com a teoria marxista do imperialismo, todas as formas de violência internacional foram provocadas pelas contradições estruturais do capitalismo, que consegue fazer do Estado um instrumento cada vez mais eficaz a serviço dos seus fins. O imperialismo seria assim um instrumento essencial para fazer face às contradições do capitalismo e para prolongar a sua sobrevivência, estendendo-as ao âmbito internacional com a exploração de outros povos. Mas a União Soviética, socialista, também foi imperialista, assim como a Rússia ainda o tenta ser. Portanto, historicamente, como política de expansão e domínio territorial, cultural e econômico de uma nação sobre outras, ou sobre uma ou várias regiões geográficas, o imperialismo extrapola os sistemas econômicos, políticos e sociais.

Como o capital sempre venceu — ou sempre vence? — o imperialismo, ou, mais modernamente, o neocolonialismo, é associado ao contexto do capitalismo e à busca por mercados e lucro à força, a qualquer custo. Inclusive militar. Os Estados Unidos invariavelmente justificaram intervenções militares no mundo para combater revoluções ou para obter o controle de mercados com o discurso da Guerra Fria, e não em termos de objetivos imperiais. Mas a verdade é que a guerra virou um negócio para os capitalistas — americanos, sobretudo — e, hoje, grande parte da economia estadunidense está ancorada nesse “setor”. Dois autores norte-americanos estudiosos do capitalismo monopolista, Paul Baran e Paul Sweezy, afirmam que os Estados Unidos não teriam tido, depois da Segunda Grande Guerra, um desenvolvimento econômico tão impressionante se não tivessem destinado parte considerável do seu orçamento aos armamentos. Garantindo ocupação para grande massa da população que seria improdutiva e investindo no setor tecnológico, pois grande parte das mais importantes invenções, usadas também no setor civil, provêm da atividade de pesquisa do setor militar.

Assim, voltando à cronologia das ações militares imperiais americanas iniciadas na semana passada, já nos anos 90 os EUA não se limitaram a intervir na América Latina, também estiveram presentes em “ações humanitárias” na Somália, Bósnia e Kosovo. No Afeganistão, mantiveram bem armados os exércitos do talibã para só depois considerá-los inimigos, destruindo-os na guerra pós 11 de setembro de 2001.

1995 - Os ianques invadiram mais uma vez o Haiti, com o argumento de que o governo de Bertrand Aristide era corrupto. Então, para “salvar” o povo, lá foram os marines. Estão lá até hoje, junto com tropas de outros países, entre eles o Brasil.

1999 - Entram também na Colômbia, desta vez com a bênção dos governantes locais. Sob o pretexto de combater o tráfico de drogas — os norte-americanos são os maiores consumidores de cocaína do mundo — programam o Plano Colômbia, que mantém a região sob o seu domínio militar, bem às portas da Amazônia, berço da maior biodiversidade do planeta.

2002 - Avançam sobre o Afeganistão e depois invadem o Iraque, sempre ancorados em fragorosas mentiras. E as mentiras seguem sendo as mesmas, desde o século 19.
2002 - Desde 1998, quando Hugo Chávez assume a presidência da Venezuela, os Estados Unidos vêm tentando colocar por terra todas as idéias nacionalistas que foram se conformando no andar do governo. E o poderio estadunidense é ameaçado quando Chávez começa a falar em socialismo, nacionalização do petróleo, combate à Alca e aproximação com Fidel Castro. Até que o serviço secreto inicia a mesma sorte de tramas, intrigas e formação para o golpe, que acontece em abril de 2002, mas dura pouco tempo.

2005 - Na Bolívia, vence as eleições um aymara que tinha no seu programa a proposta de nacionalizar as riquezas até então em mãos estrangeiras e dar autonomia às nações indígenas. A vitória esmagadora de Evo Morales lhe dá a condição de iniciar reformas que arrepiam o cabelo da oligarquia branca de Santa Cruz, que começa a chamar o separatismo. Tudo orquestrado pelos irmãos do norte. Não bastasse isso, Rafael Correa vence as eleições no Equador com um programa mais próximo de Hugo Chávez e Evo Morales. Era a formação do “eixo” de esquerda que deveria ser extirpado.

“A ação conjunta entre as elites predadoras nacionais e o estado terrorista ianque é recorrente e parece seguir sempre o mesmo método: criação de focos desestabilizadores, instrução militar, apoio financeiro e mentiras, muitas mentiras. Estas são reproduzidas à exaustão pelos grandes meios de comunicação, na eterna lógica de desinformação e de fortalecimento da ideologia dominante. Assim, com o mesmo velho método já utilizado em 1836, quando insuflou a elite da região do que hoje é o Texas a se separar do México, os Estados Unidos atenta contra a soberania dos povos sempre com o mesmo objetivo: garantir o seu domínio sobre países e as riquezas dos povos”. A opinião, fundamentada, é do historiador e pacifista estadunidense contemporâneo Howard Zinn, no livro “Uma história popular dos Estados Unidos”.

Mas, retornando à questão inicial: Barack Obama mudará a política imperialista dos EUA com relação à América Latina? Talvez sim, mas não por altruísmo. Por interesse. Um relatório publicado recentemente pelo instituto americano Council on Foreign Relations (CFR), entidade baseada em Nova York, afirma que os EUA devem “aprofundar as suas relações estratégicas” com Brasil e México. O texto também sugere que o governo americano reavalie suas relações com Venezuela e Cuba.

O documento intitulado “Relações EUA-América Latina: Uma nova direção para uma nova realidade” afirma que a região mudou e já não depende tanto dos norte-americanos. “A América Latina nunca foi tão importante para os Estados Unidos como agora. A região é a maior fornecedora de petróleo para os Estados Unidos e uma forte parceira no desenvolvimento de combustíveis alternativos”, diz o documento.
“Este relatório deixa claro que a era da influência dominante dos Estados Unidos na América

Latina acabou. Países dentro da região não só se tornaram mais fortes como também expandiram relações com outras nações, como China e Índia”.

O CRF reconhece que por 150 anos a diplomacia americana foi baseada na Doutrina Monroe, que reivindicava “a América para os americanos”. No entanto, nas últimas duas décadas, esta visão teria se tornado “obsoleta” e Washington teria falhado na tarefa de readaptar sua política externa à nova realidade da América Latina. Portanto...

MARCOS CARDOSO

Publicada: 01/02/2009
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