Correio de Sergipe – É verdade que você deu entrada em ação na Justiça Eleitoral para anular as eleições de Aracaju? O que exatamente representa essa ação?
Almeida Lima – Sim. Trata-se de uma Ação de Impugnação de Mandato Eletivo que objetiva anular as eleições, cassar os diplomas de Edvaldo Nogueira, que foi declarado eleito, e de seu vice Sílvio Santos e, conseqüentemente, convocar novas eleições.
C.S. – Baseado em que você pede a anulação das eleições?
A.L. – O pedido tem por base a constatação de fraudes em todas as urnas e, também, pelo fato de que as mesmas, embora não tivessem sido aprovadas nos testes de funcionalidade, a justiça eleitoral, indevidamente, as usou no dia da eleição.
C.S. – Você não está fazendo uma denúncia muito grave?
A.L – Não! Grave mesmo foram os atos praticados, cuja responsabilidade desejo ver apurada e os culpados punidos. A denúncia é, apenas, a conseqüência.
C.S. – Você apresentou provas? Quais foram mesmo os fatos, pode especificar?
A.L – Sim, eu apresentei um Laudo Pericial produzido pela Staff Technology, empresa especializada na matéria, que chegou às conclusões de fraude e de impropriedade das urnas para a eleição, e isto ela fez a partir da análise dos LOG das urnas, que significa registro de ocorrência das urnas, uma espécie de “caixa preta” da urna, como aquelas que existem nos aviões e que registram tudo que acontece. Ora, a perícia aponta que todas as urnas foram violadas na véspera da eleição, no dia 04 de outubro, o que se trata de uma aberração. No dia 26 de setembro as urnas foram preparadas, testadas e lacradas, e lacradas deveriam permanecer até o dia da eleição, o que não ocorreu, pois no dia anterior elas foram violadas, pois as suas funções internas foram mexidas, o que não poderia acontecer.
C.S. – Mas você fala, também, de impropriedade das urnas. Por que, elas não prestam?
A.L – Não, não é o caso de não prestar. É verdade que eu faço críticas a esse sistema desde 2003 quando cheguei ao Senado Federal. A verdade é que a lei determina, como pré-requisito de funcionalidade e de legitimidade do pleito, que as urnas, após serem preparadas, elas sejam testadas em todas as suas funções, exatamente para se saber se elas estão funcionando ou não, e o que ocorreu é que os testes não foram feitos em várias funções de todas as urnas e, o mais grave é em relação aos testes que foram feitos as urnas apresentavam defeitos e, mesmo assim, elas foram utilizadas no pleito, o que é um absurdo e uma irresponsabilidade inominável.
C.S. – Além da violação das urnas a que você se refere e à falta dos testes nas urnas, existem outros fatos relevantes que sustentam a tese da anulação da eleição?
A.L – Sim. Por exemplo, a perícia constatou que nas 916 urnas preparadas para a recepção de votos, os Log registraram 2.990 votos que não foram computados e não apresentam nenhuma classificação dentro do sistema, lá estando como se fossem um corpo estranho. Outro caso grave é que o número de eleitores habilitados a votar não confere com o número de votos para prefeito, incluídos os votos em branco e nulos, não conferem, também com o número de votos atribuídos a vereador, em branco e nulos, e também com o número de votos computados. No mais, esclareça-se que outros fatos virão à tona agora com as perícias judiciais que serão realizadas.
C.S. – E quem fez a violação das urnas, quem é o autor das fraudes a que você se refere?
A.L – Este é um fato que eu, também, desejo saber. Por essa razão eu ajuizei uma representação com caráter correicional junto ao Tribunal Superior Eleitoral, em Brasília, para que esses fatos sejam apurados e os responsáveis punidos. Agora, uma verdade é muito patente: as urnas são instrumentos próprios do processo de votação e elas sempre estiveram sob a guarda da Justiça Eleitoral, ou seja, do TRE de Sergipe e das quatro zonas eleitorais de Aracaju. Portanto, esta é uma resposta para eles darem. O que eu posso afirmar é a ocorrência de fraude. Ela está comprovada.
C.S. – Senador, já se passaram três meses da eleição, por que só agora, após a posse do prefeito Edvaldo Nogueira, é que o senhor entra com essa ação?
A.L. – Sempre utilizo como parâmetro de minhas ações a responsabilidade. Sempre agi dessa forma. Não faço pirotecnia com coisa séria. Precisava estudar o caso, obter provas. Esse foi o tempo necessário para que eu conseguisse as respostas às indagações do tipo “senador o que foi que houve, o senhor não acha estranho esse resultado?”, feitas pelos amigos e por centenas de pessoas que me abordaram nas ruas após a divulgação do resultado.
C.S. – O senhor fala em resultado estranho, esta não é a afirmativa de quem perde a eleição?
A.L. – Não! Esta referência a perdedor é uma hipocrisia que se levanta exatamente para se inibir atitudes como a minha. Eu não pedi as eleições, quem perdeu a eleição foi o eleitor que pensa que elegeu um candidato, quando, na verdade ele está elegendo outro. Quem perdeu foi a democracia. Aliás, vale a afirmativa de que “Eu sei em quem votei. Eles também. Mas só eles sabem quem recebeu meu voto”. Ora, eu já ganhei e já perdi eleições. É bom que se lembre que a eleição aconteceu há noventa dias e eu não dei uma única entrevista. Não emiti nenhuma declaração em todo esse tempo. Aliás, esta é a primeira vez que estou falando, e assim faço porque agora estou apresentando provas. Lembre-se, também, que o primeiro a denunciar erros e fraudes não fui eu, foram os vereadores e, principalmente vereadores como Elber Batalha e Chico Buchinho, ambos aliados do PT e do prefeito declarado eleito. Quando eu falo em resultado estranho eu me refiro não só a uma avaliação minha, mas da quase totalidade da população de Aracaju que esperava segundo turno para essas eleições. Aliás, o resultado foi tão estranho que nem comemoração houve, é como se ele já fosse esperado e comemorado com antecedência.
C.S. – Mas o TRE já prestou esclarecimentos inclusive com a divulgação de notas. Elas não foram satisfatórias?
A.L. – Vocês se lembram da divulgação dos resultados feita pelo TRE na qual apareceram centenas de candidatos a prefeito e a vereador fantasmas? Pois bem, o próprio presidente do TRE confessou, através de uma manifestação junto ao TSE, que o TRE de Sergipe descumpriu uma determinação do Tribunal Superior ao fazer uso de um programa chamado SIAPRE e que somente foi usado pelo TRE de Sergipe, o que se constitui uma ilegalidade. A própria Secretaria de Informática do Tribunal Superior já declarou que o problema foi do TRE de Sergipe.
C.S. – Mas, ainda assim, não foram apenas erros de divulgação?
A.L. – Não. Na nossa avaliação os erros apontados com a divulgação dos dados pelo SIAPRE representam, apenas, a conseqüência. Os erros do SIAPRE para nós representam a febre causada pela infecção de todo o sistema de votação e apuração. O SIAPRE não foi a causa, nele está a ponta do iceberg. Por ele ficou demonstrado que muito havia escondido e que precisava ser esclarecido com um trabalho de auditoria que o próprio TSE se negou a fazer de imediato, mas, com certeza, em nome da lisura que devem ter as eleições em todo o Brasil, irá proceder.
C.S. – Então a ação de impugnação foi proposta contra a Justiça Eleitoral?
A.L. – Não! A ação foi proposta contra Edvaldo Nogueira e contra Sílvio Santos. Acontece que os fatos sobre os quais se baseia a ação têm como agente principal, confessadamente, a Justiça Eleitoral, particularmente e, como alvo, a jurisdição das Zonas Eleitorais do Município de Aracaju e o próprio TRE. Por isso mesmo, faltam às jurisdições zonais e regional a necessária isenção que lhes permita a entrega desinteressada da prestação jurisdicional pretendida, o que nos levou a propugnar pela competência do Supremo Tribunal Federal com base no que estabelece a Constituição Federal em seu art. 102, inciso I, letra “n”, isto porque há interesse e conseqüente impedimento de todos os membros da Justiça Eleitoral envolvidos no processo das eleições de Aracaju.
C.S – Você não tem medo de ficar "marcado" por esse processo? Não é uma luta "quixotesca" essa sua?
A.L. – Não me vejo nesse processo como, apenas, o candidato a prefeito de Aracaju. Não esqueça que sou um Senador da República e a minha preocupação é republicana, ela extrapola os limites de Aracaju. Estou preocupado com a legitimidade do processo eleitoral brasileiro. O meu trabalho visa a defesa do respeito à soberania popular. Ainda que desnecessário, impõe-se afirmar que a Soberania Popular é o pressuposto básico para o Estado Democrático de Direito. O seu exercício, que se dá pelo sufrágio universal, pelo voto direto e secreto, é a fonte legítima de todo poder. Fora desse parâmetro, o poder é um incesto, uma aberração, pois fruto da fraude, da violação. O Brasil, de forma solene e majestática, afirma constituir-se em Estado Democrático de Direito. Desse modo, à Justiça Eleitoral compete eliminar quaisquer vícios do exercício da Soberania Popular a fim de tornar clara e pura a vontade popular, e a investidura no cargo não ser uma degeneração.
C.S – Este processo não lhe preocupa de alguma forma?
A.L. - Vou relembrar dois casos: eu fui o primeiro a denunciar o então ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu. A imprensa, naquele momento, me estraçalhou. Fui apelidado, achincalhado e tentaram me destruir. Um ano depois, com todas as acusações por mim feitas mostrando-se verdadeiras, desvendou-se o escândalo que ficou conhecido como "Mensalão". Hoje, José Dirceu é réu e está incluído na chamada "quadrilha do Mensalão", conforme denunciado à Justiça. A outra história é menos pública, mas não menos verdadeira, pois em 2003, logo ao assumir o mandato de senador, portanto vindo de uma eleição em que saí vitorioso, travei debates e busquei assinaturas dos outros senadores com vistas a exigir que o voto, mantendo-se eletrônico, também viesse com a impressão de cada voto individualmente, para que o eleitor pudesse ter certeza de que havia votado mesmo em quem desejava e para que houvesse uma forma de fiscalização real de cada eleição, com o voto material existindo e não ficássemos a mercê apenas da palavra de técnicos em eletrônica e informática. Fui voto vencido, mas os debates que travei estão lá, no Senado, como prova de que eu sempre lutei pelas causas que garantam a seriedade do processo eleitoral e democrático em nosso país. Portanto não tenho medo das conseqüências porque sei que a minha luta é para o bem comum. Como eu já disse, eleição se ganha e se perde. O que não se pode aceitar é que a vontade do povo não seja respeitada por conta da manipulação tecnológica que vem sendo feita e que a nossa investigação comprova. Ainda que tentem me ridicularizar, fico tranqüilo, pois sei que a história será o meu tribunal. E o povo será o meu juiz. Só não vou ficar calado diante de um caso que, neste momento, ocorreu em Aracaju, mas que pode prejudicar a todo o povo brasileiro. Vou levar esse assunto à tribuna do Senado e não me darei por satisfeito com nada menos do que a verdade. No mais, quem deve temer posições como esta que assumo é quem tem rabo preso, o que não é o meu caso.
C.S - A representação que você fez ao TSE já foi negada pelo Ministro Relator. Você não acha que vai acontecer a mesma coisa?
A.L. - Não. Primeiro porque a representação que apresentei em Brasília ainda não transitou em julgado, pois contra a decisão já proferida irei apresentar recurso. Por outro lado, a decisão tomada pelo TSE não levou em consideração o Laudo Pericial, pois este ainda não existia e, assim, não era do conhecimento do TSE. Este fato novo será levado aos autos da representação. No mais, no TSE tramita um procedimento administrativo de correição, com a ação ajuizada, estabelece-se um processo judicial que, a nosso ver, será julgado pelo Supremo Tribunal Federal.
C.S – A sua ação é um caso isolado no Brasil, ou você conhece outros casos?
A.L. – Existem vários casos espalhados por todo o Brasil. A própria imprensa registra casos no Estado do Maranhão, Minas Gerais, São Paulo, Rio Grande do Sul e vários outros estados o que demonstra a fragilidade do sistema eleitoral de urnas eletrônicas. A verdade é que esse sistema, embora criticado por parte expressiva da comunidade científica brasileira, cujo modelo apesar da publicidade que a Justiça Eleitoral faz, nenhum outro país do mundo lhe acolheu por não lhe dar credibilidade, numa lista que vai do Paraguai aos Estados Unidos – pátria da Microsoft –, e a Justiça Eleitoral insiste em não fazer auditorias, nem simples correições, mesmo que diante de fatos concretos que apontam fraudes.