De um lugar onde se costuma querer colher antes de plantar; tirar a foto de inauguração antes de terminar o projeto no papel, onde a esperteza é tanta que quase todos vivem tropeçando nela – e por isso pouco anda, diante das reais possibilidades... Maria Thétis Nunes, que nos deixou nesta madrugada de domingo, 25 de outubro de 2009 fez o caminho inverso: foi uma cientista. Um personagem além das homenagens interesseiras e das armadilhas que usam a vaidade humana para aprisionar. Amiga do saber. E de quem também o fosse. Por isso foi e será sempre grande. A primeira personagem itabaianense de densidade além fronteiras.
Parafraseando Humberto de Campos quando da morte do laranjeirense João Ribeiro: Cai uma sucupira na Itabaiana; qual pé de jurubeba tomará seu lugar?”
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(“Cai um jequitibá no Nordeste. Qual marmeleiro será plantado em seu lugar” - Humberto de Campos)
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Biografia (incompleta. Só ate 2006)
Nasceu em Itabaiana, Estado de Sergipe, em 06 de janeiro de 1923, na hoje Rua 13 de maio – à época, Rua do Cisco. Filha de José Joaquim Nunes e Maria Anita Barreto, foi criada sob as orientações de D. Anita e de sua querida avó, D. Emília Barreto, já que seu pai, viria a falecer quatro anos depois, deixando, além de Thétis, seus irmãos Fernando e Maria Emília. Cursou seu aprendizado básico sob as orientações da Professora Izabel Esteves de Freitas – D. Bebé – em Itabaiana.
A família, amedrontada com a possibilidade de invasão da Cidade pelo bando de Lampião, e fustigada pelos efeitos da seca, transfere-se para a Capital, Aracajú em 1935, para sorte de Thétis que assim livrou-se de ir para um internato em Própria, e de onde certamente sairia com o destino de quase todas as meninas que para lá foram: no máximo ser uma professora primária no interior, casar e encher uma casa de filhos, ou talvez apenas as duas últimas opções.
À chegada em Aracajú coincide com o primeiro ato de independência que acompanharia Thétis até os dias de hoje: ingressou no Colégio Atheneu Pedro II, onde a esmagadora maioria era de alunos (não era lugar para moças).
Conclui o Ginásio em 1938; em 1940 faz o Curso Complementar, concluindo-o em 1941 e em 1942 ingressa na recém criada Faculdade de Filosofia da Bahia, formando-se na área de Geografia e História em 1945. Ali, além da vida estudantil comum a todos os mortais, tem contato com as primeiras experiências intelectuais acerca do marxismo, como também ajuda na fundação da revista Cultura.
Retornando à Aracaju, em 1946 assume uma Cátedra no Atheneu, de onde havia saído como aluna exemplar, chegando à condição de Diretora em 1951. Ali relançou em maio de 1954, o jornal do Colégio, “ O Atheneu” já de algum tempo inativo, e em 23 de abril do mesmo ano, o Auditório, que viria também a servir de Teatro, uma aspiração estadual votada e aprovada pela Assembléia Legislativa em 1911 e que nunca saíra do papel.
Deixa o cargo de Diretora após a vitória e posse de Leandro Maciel no governo do Estado, indo fazer cursos no ISEB – Instituto Superior de Estudos Brasileiros – a base do pensamento de centro esquerda e nacionalista que nortearia parte do então governo Juscelino Kubistchek.
Ali teve contato e participou de vários estudos com nomes da envergadura de Nelson Werneck Sodré, Álvaro Vieira Pinto, Guerreiro Ramos e Roland Corbusier. É dessa época o seu desafio de desenterrar o magnífico trabalho do também sergipano, Manuel Bomfim, ex-editor de uma das suas leituras preferidas na infância: a revista o Tico-Tico. Seu discurso de formanda no curso do ISEB, foi transformado na monografia “Sílvio Romero e Manuel Bomfim – Pioneiros de uma ideologia nacional”, somente terminada em 1966, e que graças ao golpe militar de 1964 e conseqüente censura e invasão e depredação do ISEB, só viria a ser publicado 20 anos depois pela UFS – Universidade Federal de Sergipe. Também através de sua estadia no ISEB, acaba por ser convidada para trabalhar como assistente do Professor Cândido Mendes.
Em 1961 torna-se Diretora do Centro de Estudos Brasileiros em Rosário, Argentina, mediante indicação do Governador Luiz Garcia, disponibilizando-a ao Ministério das Relações Exteriores.
Em dezembro de 64, deixa Rosário e retorna à Aracajú depois de um longo período noutras terras.
Em 1965 reassume sua condição de Mestra, logo chegando ao embrião do que viria a ser a Universidade Federal de Sergipe. Dali, atendendo também ao velho Atheneu viu os anos se passarem sob o crivo da história. Mas Thétis é também a história, já que sua vida se confunde com esta na eterna luta pelas vitórias, aqui e acolá entremeadas de fracassos.
Na UFS, foi Diretora do Centro de Ciências Humanas, até sua aposentadoria em 1993.
Em 1970, apesar de seu matiz ideológico isebiano, logo centro-esquerdista, teve seu nome lembrado em pleno vigor do AI-5, pelo então Governador Lourival Baptista para ocupar um lugar no Conselho Estadual de Educação, posição que foi conservada até 1986.
Em 1971 foi empossada no Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, onde preside até os dias de hoje.
Em 1983 passou a ocupar a cadeira 39 da Academia Sergipana de Letras, ocupando a vaga do Jornalista Orlando Dantas.
Passados os anos de chumbo da Ditadura Militar, seu trabalho conseguiu ter mais fôlego, chegando a ser premiada em 1984 pelo Ministério da Educação e Cultura como o prêmio “Grandes Educadores Brasileiros”.
Em 1986, praticamente houve uma transferência do Conselho Estadual de Educação para o Conselho Estadual de Cultura, onde se tornou Presidente a partir de 1987, dele desligando-se em 1990.
Aposentou-se em 1993, todavia mantém-se ativa rodeada de seus livros e demais papelada em busca de mais conhecimento e expansão da consciência humana: sua e dos demais. Continua, contudo, no Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe e como membro titular do Conselho de Educação da UFS, nomeada em ato da Presidência da República.
Obras Publicadas
Árabes e sua contribuição à civilização ocidental. Aracaju: Gráfica J. Andrade – 1945;
Ensino Secundário e Sociedade Brasileira. MEC/ISEB – Rio de Janeiro, 1962;
Sergipe no processo da independência do Brasil. Cadernos da UFS, n° 04, 1976;
Sílvio Romero e Manuel Bomfim: pioneiros de uma ideologia nacional. Cadernos da UFS, n° 04, 1976;
Ocupação Territorial da Vila de Itabaiana: a disputa entre lavradores e criadores. Separata dos Anais do VIII Simpósio dos professores universitários de História. S. Paulo, 1976;
História de Sergipe a partir de 1820. Rio de Janeiro: Cátedra; Brasília: INL, 1978;
Inventário dos documentos relativos do Brasil existentes no arquivo histórico ultramarino. UFS/DFH: Programa de documentação e pesquisa histórica (PDPH), 1981;
Geografia, História e Antropologia em José Américo. (Maria Thétis Nunes, Manoel Correia de Andrade e José Otávio Melo. Fundação Casa José Américo, João Pessoa-PB, 1982;
A política educacional de Pombal e sua repercussão no Brasil-Colônia. Separata dos Anais da II Reunião da Sociedade Brasileira de Pesquisa Histórica (SBPH), S. Paulo, 1983;
História da Educação em Sergipe. Rio de Janeiro. Paz e Terra; Aracaju: Secretaria de Educação e Cultura do Estado de Sergipe: Universidade Federal de Sergipe, 1984;
Manuel Luiz Azevedo d’Araújo, Educador da Ilustração. Prêmio Grandes Educadores Brasileiros, 1984, INEP, Brasília, 1984;
Sergipe Colonial I. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro; Sergipe: UFS, 1989;
Sergipe Colonial II. Rio da Janeiro: Tempo Brasileiro, 1996.
Sergipe Provincial I: 1820-1840, Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro, 2000.
Sergipe Provincia II: 1841-1888, Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro, 2006.
Artigos e Ensaios
Qual o significado do 24 de outubro? In: Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe. 27; 55-61; 1965/1978;
Sergipe no processo republicano brasileiro. In Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe. 29; 9-17; 1979/1982;
As culturas de subsistência em Sergipe; a farinha de mandioca. In Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe. 29; 11-16; 1983/1987;
Tobias Barreto e a renovação do pensamento brasileiro. In Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe. 30; 31-39; 1989;
Insurreição de Santo Amaro das Brotas – antecedentes. In Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe. 31; 127-137; 1992;
A contribuição da Imprensa à História da Província de Sergipe. In Revista da Academia Sergipana de Letras. 31; 111-120; 1994;
Carvalho Lima Júnior, In Caderno de Cultura do Estudante. Ano III; 3; 87-89; 1986;
Felisbelo Freire, o Historiador. In Caderno de Cultura do Estudante. Ano IV; 4; 92-93; 1987;
João Ribeiro, o intelectual de múltiplos facetamentos. In: Caderno de Cultura do Estudante. Ano V; 5; 82-84; 1988;
O ciclo do gado em Sergipe. In Revista Sergipana de Cultura. Ano II; 2; 33-36; 1978;
Fundamentos Econômicos da Literatura Sergipana. In: Caderno Cultural. Brasília: Imprensa Nacional. Ano III; 14; 15-17; 1989;
O poder legislativo e a sociedade sergipana. Separata dos Anais da XIV Reunião da Sociedade Brasileira de Pesquisa Histórica (SBPH). Salvador-BA. 1994;
As Câmaras Municipais, sua atuação na capitania de Sergipe d’El Rey. XV Reunião da Sociedade Brasileira de Pesquisa Histórica (SBPH). Rio de Janeiro, 1995;
A contribuição de Felisberto Freire à historiografia brasileira. Separata dos Anais da XVI Reunião da Sociedade Brasileira de Pesquisa Histórica (SBPH). Curitiba-PR; pp. 83-86; 1996;
Manuel Bomfim (1868-1932). Separata da Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, 155 (384): 558-567; jul/set. 1994;
A Educação na colônia: os jesuítas. Separata da Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, a 156, n° 389; 1997;
A totalidade na História. In Revista Quadrimestral das Unidades de Ensino Superior dos Institutos Paraibanos de Educação – UNIPÊ. 1 (3); 154-155, 1997. (Série Ciências Exatas e da Natureza);
O Bicentenário do baiano Antonio Pereira Rebouças, sua passagem pela província de Sergipe. Separata dos Anais da XVIII Reunião da Sociedade Brasileira de Pesquisa Histórica (SBPH). Rio de Janeiro; pp. 261-166; 1998;
A importância dos Arquivos Judiciais na preservação da memória nacional. In Revista do Centro de Estudos Judiciários, Brasília, n° 5, pp. 109-116, mar/ago. 1998.
Além das obras supra citadas, merecem destaque os inúmeros artigos escritos para também inúmeras publicações jornalísticas, notadamente a Gazeta de Sergipe.
Postado por Almeida às 13:00
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