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Aracaju,
 
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A culpa é dos Garis

4/3/2009

(*) José Lima Santana
 
Andei por aí, do fim de janeiro ao fim de fevereiro, batendo pernas pelo Velho Mundo e, depois, fui à terra portenha saber se a Presidente Cristina Kirchner precisava de uma ajudazinha extra para tentar resolver a crise no setor primário argentino, que se arrasta há algum tempo e que, provavelmente, deverá se prolongar por conta, incluvise, da crise que, mais uma vez, vem dos States. Sempre eles! Aliás, será uma beleza comemorar os 80 anos da quebradeira de 1929. Crise para comemorar crise. Inusitado! Que o diga o meu primo distante, Obama. Primo, sim, pois descobri que um dos meus tetravôs paternos veio da mesma aldeia onde nasceu o Obamão (pai do Obama).
  
Cheguei cansado das andanças e estou em falta com o Ronaldo Ramos (será que esse cabra é parente da Lilian Ramos, aquela da calcinha, no Carnaval de 1994, ao lado do presidente do topete?). Agora, ela é uma madona. Deu a volta por cima. Por falar em Carnaval, calcinha, topete e presidente, este ano o Lulalá foi ao Sambódromo (e viva o gaúcho que construiu a passarela do samba, ao menos por isso!) e distribuiu camisinha à vontade. E olhe: há quem sustente que ele não tomou nem um golinho. Pode? Pode, sim. Se ainda fosse um golão... Claro que não se tratou de camisinha verde rosa, da minha querida Mangueira, empacada no 6° lugar. Foi aquela outra, aquela, sim, que todo mundo, que tem boa cabeça, deve usar. A Igreja Católica (um pouquinho reacionária, só um pouquinho) deve ter a-d-o-r-a-d-o o ato lulista. Depois do bolsa família, virá o bolsa camisinha. O Ministério da Saúde já está providenciando o projeto. Depois, é só passar pelo crivo de Mãe Dilma, e tudo certo. E dá-lhe, Lulinha Paz e Amor! Atichimmm...! Êpa, vou pegar um resfriado...

Como estava a dizer (dá para perceber que eu estive na terrinha...), voltei cansado e cheio de preguiça, não minto. Mais uma vez me socorri do meu velho e bom compadre Peixotinho do Umbuzeiro. Telefonei para a sua casa, mas ele estava na caatinga, averiguando a toca de um tatu. Não precisa nem dizer o que significa toca de tatu na linguagem de cabras casados, senvergonhas, que dão suas boas escapadas (no sertão se diz “escapulidas”). Mas esse tipo de sujeito, politicamente incorreto, está em extinção, graças a Deus.

Hoje, bem cedinho, ele retornou a ligação. Pedi-lhe que me mandasse alguma coisa para o Ronaldo. E não é que o compadre gostou? O sujeito vai mesmo tomar gosto por esse negócio de escrever para o site do Ronaldo. E por falar novamente no Ronaldo, não é que o Fenômeno já caiu na noitada? Ora, demorou. Já rolou até a cabeça de um diretor corinthiano. O bicho é mesmo um Fenômeno, ou melhor, é o Fenômeno das Noitadas, etc. e tal. Mas deixa pra lá. Ele ainda vai botar o Coringão lá em cima. De onde? Aguardemos.

Acabo de receber, por e-mail, passado pela minha afilhada, a Belinha, universitária, estudante de Ciências Contábeis, pois como alguns devem lembrar, o meu compadre ainda escreve com tinta e papel, que, segundo ele, “não tem engancho”. É, computador engancha. Meu compadre gasta tinta bic e minha afilhada passa tudo para o cumputer. A carta é quase curta. Lá vai.

 
       
Boca do Sertão, 04 de março de 2009.


        Meu estimado compadre Dr. Zé Lima,

O senhor gostou do passeio? Veja bem, o senhor ultimamente tem levado a vida trotando pelo mundo, andando mais do que cavalo de cachaceiro, que anda de bodega em bodega, um copo aqui, outro ali e outro mais acolá. Pelo visto, o senhor tem mais horas de voo do que de birô. Ah, é verdade mesmo que tiraram o acento da palavra voo? Quem me disse foi minha filha, universitária, que agora vai fazer contas pra danar. Quem sabe, se mais tarde não vão querer contratá-la para contar os dólares dessa cambada de gabiru, que anda por aí? Só não quero que ela vá contar os dólares da cueca de filho da mãe nenhum. Ah, isso não! Uma filha de Peixotinho só passa a mão em cueca de marido. Porém, contudo, todavia, e pensando bem, gente minha, sangue do meu sangue, nervos dos meus nervos, não se mistura com gabiru, não. E ponto final. Mas esse negócio de tirar acento, e coisa e tal, tem me deixado danado da vida. Por que é que tem que ficar mexendo no português? O bicho já não é complicado demais? Estou mais perdido do que cego em briga de faca no escuro. Ora, bolas! Dizem as boas línguas que a culpa é do Sarney, presidente e acadêmico. Mas isso deve ser coisa lá do Jarbas. Despeita, na certa.
 
Meu compadre, aqui por estas bandas da boca do sertão, onde a chuva faz que vem e não vem, a não ser por uma ou outra mijadinha, coisa miúda que só dá mesmo para apagar a poeira, tem muita gente que faz artes. Não estou falando daquelas artes que o senhor bem conhece e gosta (ao menos gostava quando era mais novo; com a idade a coisa vai se desmilinguindo, embora já tenha jeito para isso, como o senhor bem sabe), mas de arte mesmo, arte popular, artesanato, bordado, esculturinhas no barro ou na madeira, e coisas que tais. Arte de pobre, mas arte. E por aqui todo mundo respeita a arte de alguém. Afinal, é um dom precioso que a poucos foi dado cultivar. Pois bem.

Fiquei sabendo que um sujeito de Aracaju (se não me falha a memória é um tal de Zé Fernandes) anda doente por causa de que jogaram no lixo uma arte lá dele, uma pintura, um painel, que ele levou 45 dias para realizar, a custo zero, e que estava num parque da Prefeitura. Como é que pode, compadre? Se fosse por estas bandas, por onde Lampião e Maria Bonita gastaram uns quatro pares de alpercatas e uns quatro quilos de bala de fuzil, a coisa não ficava barata, não. É por isso que dizem que o sertanejo tem sangue no olho e cabelo nos buracos das ventas. Onde já se viu jogar no lixo a arte de alguém? E pelo que eu pude apurar, o tal Zé Fernandes é bem conhecido aí pelo Aracaju. Não é um tipo qualquer, não. Mas também fiquei sabendo que a culpa foi de uns inocentes garis. Mas, logo dos garis? Ora, veja só. Já descobriram os culpados: uns garis. E foram mesmo os garis, ou estão botando panos quentes, arranjando uns bodes expiatórios, como os grandolas sempre fazem para tirar o corpo de banda, para tirar o dito cujo da reta, como se diz? Eu soube até que deu reboliço na Assembléia. Teve deputado e deputada que falaram pra danar. Mas teve gente da imprensa que não tocou no assunto. Dizem que foi por medo de perder a grana da publicidade oficial. Será que isso é verdade, meu compadre?
 
Há duas coisas com as quais eu não posso concordar: a primeira é o fato de jogarem no lixo a arte de um pintor da nossa terra, que tem conceito. Arte não é para jogar no lixo, como lixo não é receptáculo (gostou do palavreado, meu compadre?) para se jogar arte nenhuma; a segunda é que não posso aceitar a desculpa esfarrapada, e, mais do que isso, fabricada, de que a culpa é dos garis. Então os garis tiveram a brilhante idéia de cobrir estrume, cocô de boi (ou de vaca), com o painel do Zé Fernandes, depois que o retiraram do relógio que a TV do Plim Plim instalou para celebrar os 500 anos da chegada de Cabral e Caminha? Hum... isso dá nome de dupla sertaneja. Sujeitinhos de iniciativa esses garis, né não? Daqui a pouco vão ser promovidos, por merecimento, a diretores da EMSURB, a tal empresa da Prefeitura de Aracaju que cuida dessas coisas de lixo. Que sacanagem!
 
Meu compadre, sacanagem é uma palavra que já pode ser usada na internet? Que fazem sacanagens pela internet, todo mundo sabe. Mas escrever certas palavras, não sei não. Afinal, algumas delas dão coceira no “olho” de quem lê, de gente cheia de moralismos, ou melhor, de falsos moralismos. Gente besta, que é o que tem muito no mundo, da planície ao Planalto.

Quando eu for a Aracaju, quero conhecer esse tal de Zé Fernandes, viu compadre? Quero ser solidário com ele (aliás, já estou sendo). Quero também ser solidário com os garis que arranjaram para colocar a culpa, mas não disseram os nomes. Ah, já sei: esses garis não têm nome. Não poderiam ter nomes se são garis inventados. Né não? Fico por aqui, meu compadre. Vou, agora, fazer uma coisa que o senhor também gosta, ou gostava quando era mais novo: comer um beiju misturado, na casa de farinha das meninas do finado Tonho Tapioca. O senhor lembra do gosto dos beijos, digo, dos beijus daquelas meninas, né não?

A sua comadre, cada vez mais resmungona, manda lembranças. E Belinha lhe pede para ser abençoada. As aulas dela já começaram, mas ela só vai poder frequentar a Faculdade a partir da semana que vem, pois o incômodo dela esse mês veio mais brabo do que boi preto quando vê pano vermelho. E também ela ficou sabendo que está faltando professor na UFS. Mas será possível? Apareça, meu compadre, para um dedo de prosa.

Um abraço do seu compadre José Parente Peixoto, Peixotinho do Umbuzeiro.


(*) Advogado. Mestre em Direito Constitucional. Professor da UFS. Membro da Academia Sergipana de Letras e do IHGSE.

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