Priscila Cury
A crise econômica está aumentando o movimento nos escritórios de advocacia trabalhista. A tendência de crescimento da demanda foi revelada por especialistas ouvidos por Última Instância, que explicam o papel do operador do direito em um momento de muitas demissões e ressaltam a necessidade de negociação coletiva entre empresas e trabalhadores.
Estimativas da OIT (Organização Internacional do Trabalho) para o desemprego no mundo demonstram que, se a recessão se agravar, entre 30 milhões e 51 milhões de pessoas poderão perder seus empregos até o final do ano. A tendência, no Brasil, não deve ser diferente. O IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgou que, já em dezembro do ano passado, 110 mil trabalhadores da indústria perderam seus empregos. Foi o maior recuo desde o início da pesquisa, em 2001.
Maria Lucia Ciampa Benhame Puglisi, sócia do escritório Benhame Sociedade de Advogados, explica que os escritórios de advocacia trabalhista que lidam com a parte coletiva já podem acompanhar uma maior movimentação por causa da crise.
“A presença do advogado nas negociações coletivas, em audiências com sindicatos ou nas consultas das empresas, faz com que os especializados em direito do trabalho possam atuar mais neste momento de recessão. É o profissional que participa das reuniões, dos acordos, do trâmite para suspensão dos contratos dos funcionários”, explica Maria Lúcia.
Já o especialista em negociações sindicais do escritório Peixoto e Cury Advogados, Antonio Carlos Aguiar, afirma que o advogado participa da negociação trabalhista para oferecer o apoio técnico no momento do acordo, garantindo que o conteúdo jurídico do texto esteja de acordo com a lei. Ele ressalta a importância deste instrumento de conciliação no momento de crise.
“O acordo tem o objetivo de trazer ganho para as duas partes —empresa e trabalhador— pois gera uma flexibilização. O trabalhador não perde direitos. Ele apenas faz concessões para a empresa, a fim de que lhe seja garantida a estabilidade de emprego. Se a o acordo tiver uma renúncia de direitos apenas do trabalhador, este instrumento não tem validade legal, ainda que assinado pelo sindicato”, ressalta o advogado.
Maria Lúcia afirma que só na semana passada participou de três acordos coletivos e nesta semana que começa já está negociando mais dois. Ela diz que este papel na negociação é importante pois faz a mediação entre os sindicatos de trabalhadores e as empresas, além de ter a função de evitar as demissões.“Os acordos têm sido positivos para os funcionários, especialmente para aqueles de menor renda”, afirma a advogada.
Reflexos
Aguiar explica que o setor contencioso dos escritórios trabalhistas ainda não acompanhou este mesmo aumento. Ele prevê, no entanto, que isto deve ocorrer em breve, já que o número de demissões está cada vez mais alto.
“A previsão é que o contencioso acompanhe o aumento quando o tempo do seguro-desemprego acabar. Esta majoração também vai depender do andamento da crise. Se o empregado demitido não conseguir se recolocar no mercado, ele vai procurar o Poder Judiciário para que seus direitos estejam garantidos na rescisão do contrato de trabalho”, ressalta o especialista.
A advogada Cristina Stamato, do Machado Silva Consultoria Jurídica, revela, contudo, que seu escritório já sente os reflexos das demissões em aspecto diverso da negociação coletiva. A maior procura diz respeito a primeiros atendimentos de empregados temerosos com uma possível demissão ou por aqueles que já foram dispensados. “O escritório teve de aumentar o horário para atendimentos iniciais. Em janeiro e fevereiro já trabalhamos com o movimento alto, como se fosse meio do ano”, diz a advogada.
Com especialização nas áreas bancária e financeira, seu escritório constata que os trabalhadores deste setor são uma grande demanda para eventuais processos trabalhistas. Ela descreve, também, qual o perfil de cliente tem prevalecido nos atendimentos.
“Funcionários antigos, com muito tempo de empresa, têm demonstrado preocupação neste momento de crise. Diante do corte de pessoal, eles vão ao escritório para conhecer seus direitos pois acreditam que as empresas vão substituir seus cargos contratando pessoas mais novas por menores salários”, explica Cristina.
Maria Lucia afirma que a função consultiva do advogado vale para o trabalhador, mas também está direcionada para as empresas. Esse profissional se destaca neste momento de recessão e ganha maior demanda por ser capaz de oferecer um parecer técnico na situação jurídica das empresas. “Quando a empresa quer demitir ou negociar com os trabalhadores, ela precisa da participação do advogado”, conclui a especialista.
Última Instância