O apagão no Nordeste atingiu 286 municípios de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Alagoas, Sergipe e Bahia. O impacto foi bem menor, com uma duração máxima de 37 minutos. Muitos consumidores não conseguem entender, no entanto, como um problema ocorrido a tantos quilômetros deixou seis estados do Nordeste às escuras. Ao contrário do que a maioria pensa, nem toda a energia consumida é gerada na região. Esse déficit é suprido pelas usinas localizadas em outras áreas do país, graças ao chamado "sistema interligado". O problema é que, quando ocorre uma grande perturbação nas linhas de transmissão, vários estados são atingidos em um efeito cascata. Foi o que aconteceu na noite da terça-feira.
O abastecimento no Nordeste foi interrompido entre as 21h13 até as 21h50, segundo dados do Operador Nacional do Sistema (ONS) e das companhias de energia dos estados afetados. O problema em Itaipu resultou em um corte de 800 MW na carga da região. Mais da metade desse volumefoi em Pernambuco, que ficou sem 440 MW, cerca de 30% do seu consumo normal. Com isso, 38 cidades, sendo seis delas na Região Metropolitana do Recife, ficaram total ou parcialmente sem energia entre 21h13 e 21h47. Na Bahia, o problema atingiu 63 cidades, entre 21h14 e 21h38. No Rio Grande do Norte, 29 municípios ficaram às escuras por 25 minutos. Em Alagoas a falta de energia perdurou por 40 minutos, atingindo 40 municípios. Na Paraíba, durou apenas 21 minutos em 86 localidades. O estado menos afetado foi Sergipe, onde a interrupção teve somente cinco minutos, em 30 municípios.
Desde a década de 70, 95% do sistema elétrico brasileiro funciona de forma interligada. A exceção é a região Norte, que ainda está no sistema isolado. "Antes do sistema interligado, havia quase que uma subestação por quarteirão, sendo mais inseguro e mais caro para o abastecimento", lembra Mário Veiga, diretor da PSR, consultoria especializada em energia. A região Nordeste é uma das que mais se beneficia da interligação. Com uma demanda de 7.500 MW, a região importa de 500 a 3.000 MW, dependendo do volume dos reservatórios das hidrelétricas. Mas, da mesma forma que se troca a energia, quando há instabilidade, os problemas são compartilhados também.
"Em situações de perturbação, como esta em Itaipu, há um corte de carga para equilibrar o volume de consumo com a geração do país", afirma o superintendente de operações da Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf), João Henrique Franklin. Como houve uma grande redução da geração com a paralisação de Itaipu, a interrupção do fornecimento no Sudeste, Sul e Centro-Oeste não foi suficiente para o equilíbrio do sistema e o apagão respingou no Nordeste.
A região, em vez de receber 600 MW como estava previsto pelo ONS, precisou enviar 700 MW para o Sudeste. Isso só poderia ser feito com a redução do consumo na região, através dos cortes que ocorrem de forma automática, e do aumento da produção. Franklin diz que houve um incremento de 1000 MW. "Cerca de 80% desse acréscimo veio do complexo dePaulo Afonso", detalha o superintendente de operações. Sem estes cortes parciais na região, a pane seria maior e o restabelecimento do sistema em todo o país demoraria mais. Os cortes ocorrem em ordem de proximidade com a origem do problema. Por isso, por estarem mais distantes de Itaipu, Ceará, Piauí e Maranhão não foram afetados.
Brasil no escuro
1999
Mais de 60% do território nacional foi atingido pelo blecaute de março de 1999, que teve início em uma subestação de energia elétrica da Cesp em Bauru (SP). O problema atingiu 10 estados das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, além do Distrito Federal, Acre e parte do Paraguai. A versão oficial para o problema foi a queda de um raio na subestação de Bauru.
Nos últimos dois anos do governo Fernando Henrique Cardoso, o Brasil conviveu com o medo de um grande apagão. Investimentos insuficientes nos anos anteriores, somados à falta de chuvas, fizeram com que o país tivesse de cortar 20% dos gastos com energia. Foi criado um "Ministério do Apagão", comandado por Pedro Parente, para gerenciar a crise. Um racionamento "voluntário" de energia foi determinado: consumidores que atingissem as metas de economia seriam premiados, enquanto aqueles que não conseguissem reduzir seu consumo seriam punidos. Em 2002, o racionamento foi suspenso.
2005
No início de janeiro, um grande blecaute atingiu osestados do Rio e Espírito Santo, afetando mais de 3 milhões de pessoas. O problema ocorreu em duas linhas de transmissão da central de Furnas, que desligaram sem motivo aparente. Uma terceira já estava desligada, por causa da demanda menor no mês. Com apenas uma linha em funcionamento, o sistema entrou em colapso. Em abril, Furnas foi multada em R$ 4,1 milhões pela falha.
2007
Em 2007, Furnas foi o pivô de mais um apagão no Rio de Janeiro e no Espírito Santo, provocado pela queda de duas linhas de transmissão.
E o mundo também
Estados Unidos
A população do Nordeste dos Estados Unidos e de parte do Canadá vivia um dos blecautes que mais marcaram a história do país. Calcula-se que 30 milhões de pessoas tenham ficado sem energia especialmente em Nova York e em Toronto. O blecaute ocorreu numa hora de pico no consumo de energia em 9 de novembro de1965, próximo das 17h30. A energia começou a voltar na mesma noite, mas só foi completamente restabelecida em Nova York 14 horas depois. Autoridades levaram seis dias para identificar as causas do blecaute, que foram apontadas como uma falha em uma estação no Canadá, que causou sobrecarga em toda a rede elétrica da região.
Canadá
Cerca de 50 milhões de pessoas foram afetadas pelo apagão que atingiu o Nordeste dos Estados Unidos e parte do Canadá, que é apontado pela imprensa norte-americana como o maior da história da região. As cidades de Nova York, Detroit, Cleveland e Toronto ficaram às escuras em 14 de agosto de 2003. A energia começou a voltar no mesmo dia em algumas regiões do Canadá, mas só foi totalmente restaurada no dia 16. Quatro dias depois do blecaute, algumas cidades mantinham esquemas especiais para transportes públicos com medo de novas quedas de energia.
Itália
Um dos piores blecautes da história da Europa deixou quase toda a Itália e parte da Suíça sem energia elétrica por nove horas em setembro de 2003. Mais de 50 milhões de pessoas foram afetadas pelo apagão que teve início durante a madrugada, interrompendo uma grande festa de rua que era realizada em Roma. Até o Vaticano foi afetado pela falta de energia elétrica, mas passou a funcionar com o uso de geradores de emergência.
Indonésia
Quase metade da população da Indonésia, um total de 100 milhões de pessoas, foi afetada por um dos maiores blecautes da história, em 18 de agosto de 2005. O fornecimento de energia foi interrompido durante a manhã em regiões de Bali e Jacarta, e só retornou à noite para 80% da população. O apagão na Indonésia foi causado por um problema na linha de transmissão no oeste de Java, e causou o interrompimento do fornecimento em várias outras áreas.
Argentina
Mesmo sem ter registrado nenhum apagão de proporções gigantescas quanto o da noite de terça-feira no Brasil, vários pequenos blecautes têm ocorrido no país vizinho nos últimos anos, o que acontece, segundo a imprensa local, por falta de investimentos públicos no setor. Em 2006, 228 mil usuários do sistema elétrico de Buenos Aires ficaram sem luz por quase 24 horas após um incêndio em uma subestação. No ano seguinte, umapagão na capital atingiu nove bairros e 168 mil pessoas em março, e um outro de quase 24 horas, ocorreu dois meses depois. Ainda em 2007, 75% da população de Bariloche ficou 16 horas sem energia elétrica.
Fonte: Diário de Pernambuco - Mirella Falcão
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