Há algo de profundamente errado nesse processo pernicioso de politização do Supremo Tribunal Federal (STF), escancarado pela ação deletéria de seu presidente Gilmar Mendes.
Tome-se o caso do Ministro Eros Grau. Paira sobre ele a suspeita de uma ambição maior do que a riqueza, do que o compadrio, menos espúria do que a propina: ele almeja a imortalidade, ser um membro da Academia Brasileira de Letras (ABL).
Uma das portas de entrada poderia ser o senador José Sarney que, dentre outros feitos, se imortalizou como acadêmico.
Em suas decisões, votos ou opiniões, Eros sempre preservou Sarney – o que em nada o compromete.
Mas o que está ocorrendo agora?
Nas eleições de 2006, o grupo de Sarney entrou com recursos no TSE contra a diplomação do governador eleito Jackson Lago, acusado de abuso de poder político. Relator do recursos, Eros foi favorável à cassação. Lago caiu e – só nesse país macunaímico – a candidata derrotada assumiu como governadora.
Antes da votação, o grupo de Lago entrou com um embargo, não reconhecendo o poder do TSE de apreciar casos originários. Ficou mofando na gaveta de Eros.
Agora, chegou a vez do TSE apreciar denúncia de abuso de poder econômico por Roseana. Eros se afasta do TSE e resolve apreciar o recurso, agora beneficiando diretamente Roseana: impedindo que seja julgada e não estendendo esse benefício ao processo que lhe deu de bandeja o cargo de governadora.
Tenho para mim, que, com algumas honrosas exceções, a atual geração de Ministros é responsável pelo maior processo de desmoralização do Supremo em período democrático.
Último Segundo - Luis Nassif
Por Charles Leonel Bakalarczyk
Prezado Nassif:
Difícil acreditar que o Eros Grau esteja protegendo a família Sarney em troca de apoio para ser membro da ABL. Mas bruxas existem…
Não conheço Grau pessoalmente, contudo admiro suas obras jurídicas e nunca soube de nada que desabonasse sua conduta.
Se for assim como você diz, fico desiludido com mais uma personalidade da República…
Se me permite, tenho algumas considerações que me fazem crer na honrabilidade de Eros Grau.
Chamo a atenção do teor do art. 224 do Código Eleitoral: “Se a nulidade atingir a mais de metade dos votos do País nas eleições presidenciais, do Estado nas eleições federais e estaduais ou do município nas eleições municipais, julgar-se-ão prejudicadas as demais votações e o Tribunal marcará dia para nova eleição dentro do prazo de 20 (vinte) a 40 (quarenta) dias”.
Em observação a esse dispositivo, o TSE decidiu: “Declarados nulos os votos por captação indevida (Art. 41-A da Lei nº 9.504/97), que, no conjunto, excedem a 50% dos votos válidos, determina-se a realização de novo pleito, não a posse do segundo colocado”. (REspe nº 19759, TSE/PR, Rel. Min. Luiz Carlos Madeira. j. 10.12.2002, DJ 14.02.2003, p. 191).
O mesmo vale para a hipótese de abuso do poder econômico e político.
Assim, se o candidato mais votado perder o mandato por força da captação indevida de votos ou abuso do poder econômico, seus votos são declarados nulos. Se obteve 50% dos votos válidos (não são considerados os brancos), cai todo o processo eleitoral e novas eleições são marcadas (diretas ou indiretas). Mas se o candidato não obteve 50% dos votos válidos, assume o segundo.
No entanto, pelo entendimento atual do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), quando o governador cassado foi eleito no segundo turno, quem deve tomar posse no seu lugar é o segundo colocado. Assim foi nas no caso dos governadores cassados Cássio Cunha Lima (PSDB) e o pedetista Jackson Lago (PDT).
Na verdade, o que ocorre nessa situação é que a anulação atinge os votos do 1° turno, em que nenhum candidato alcança o índice de 50% dos votos válidos. O abuso foi flagrado na disputa do 1° turno. Desse raciocínio jurídico resulta que as eleições não são anuladas, mas somente os votos do cassado, assumindo o cargo o 2° mais votado.
Pelo que sei, ministro Eros Grau (atuando no do STF), determinou na segunda-feira a suspensão de todos os processos que pedem a cassação de governadores, senadores e deputados federais que tramitam no TSE.
A suspensão se estenderá até que o plenário do STF decida sobre a ação apresentada por cinco partidos que questiona se o TSE tem a atribuição de julgar processos de cassação contra políticos. Os partidos sustentam que a competência seria dos TRE de cada Estado e apenas caberia recurso ao TSE.
A decisão não “beneficia” somente Roseana Sarney, mas suspende temporariamente o julgamento de processos que podem resultar em cassações de governadores Marcelo Déda (PT) e Ivo Cassol (PP).
Observem o seguinte: a decisão de Eros Grau não atinge imediatamente os governadores cassados, mas, se o plenário do STF confirmar a decisão de Grau e considerar que o TSE não tem competência para cassar mandatos, abrirá brecha para Jackson Lago questione a perda do seu mandato.
Se for nesse trilho, Eros Grau trabalhou contra a sua cadeira na ALB.
Comentário
Vamos entender um pouco melhor essa questão.
Um dos princípios fundamentais da segurança jurídica: o da coisa julgada e o princípio da dupla jurisdição. Ou seja, a de sempre se poder apelar da primeira sentença proferida. É uma das garantias do cidadão.
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) é uma corte revisora, que deve analisar decisões de instâncias inferiores. Quando ela delibera sobre o mérito, sua decisão é irrecorrível.
O que ocorreu nos últimos tempos foi governadores sendo julgados pelos TREs. Depois, os denunciantes entravam com ação direto no TSE, não em grau de apelação mas de julgamento final.
E, aí, não havia mais uma segunda instância a quem recorrer, já que o STF só analisa matérias constitucionais, não fáticas.
Por isso mesmo, a atual decisão de Eros Grau não é condenável. O que é condenável é o uso de dois pesos e duas medidas.
Autor: luisnassif - Categoria(s): Justiça, Política
Obs.: Todo material descrito acima foi retirado do Blog de Luis Nassif