A política é uma atividade que sabe, mais do que a economia ou outra qualquer, injetar boatos e esperar para ver aonde eles vão dar. Ou os estragos que vão gerar. Nos últimos dias, no âmbito sergipano um destes boatos tem se tornado insistente. É aquele que coloca o senador Antônio Carlos Valadares, PSB, no mesmo bloco do ex-governador João Alves Filho, DEM, na sucessão de 2010.
É um boato forte e de dupla face. Numa delas, Valadares seria candidato único ao Senado apoiado por João Alves, com a primazia de poder ainda indicar o candidato a vice-governador e de ter a garantia do DEM e de suas forças correlatas para a reeleição do seu rebento Valadares Filho deputado federal. Numa outra face, a coisa é mais batata ainda: Valadares simplesmente é candidato ao Governo, João ao Senado, e estaria feita a festa. Seria eleito, segundo os boateiros – e adeus Déda.
Não que houvesse ou haja alguma aberração nisso tudo, nesta relação entre um e outro. Nada disso. Valadares e João Alves são dois altos agentes da política de Sergipe que já estiveram em situações parecidas com estas dos boatos de hoje – e continuam se flertando civilizadamente. Quase amigueiramente. Há cerca 30 anos, em 1982, João se fez governador de Sergipe pelo PDS tendo Valadares como vice, e fez dele seu sucessor em 1986, já ambos no PFL – e o único do Brasil por este partido.
Em 1990, João ganhou de um fiel Valadares o brinde de um acordão que lhe dava de novo o Governo de Sergipe e o Senado a Albano Franco. Em 94, em 1998 e em 2002 estavam em palcos opostos (se reelegeu senador na chapa de Zé Eduardo, PT, candidato ao Governo); mas em 2000, Valadares disputou a Prefeitura de Aracaju com o apoio de João e do PFL, tendo Max Andrade como candidato a vice; em 2004, Valadares se aliou à reeleição de Marcelo Déda à Prefeitura de Aracaju, e em 2006 se abraçaram para o Governo do Estado, posição em que se encontram hoje.
Analisando a parceria bem-sucedida de Valadares com Déda talvez encontre-se nela a primeira tradução exata para os boatos que levam à unidade de Valadares com João: é a de desestabilizar um projeto que, em tese, estaria bem montado há quatro eleições consecutivas (contando a reeleição de Valadares em 2002 por este grupo e o apoio dele à candidatura de Edvaldo Nogueira em 2008) e a de gerar estresse naquele que está mais solenemente ajustado e sedimentado nesta lógica, que seria Déda – estribado em bons apoiadores, como o próprio Valadares, Amorim e seu grupo, Jackson Barreto, Ulices Andrade, etc.
Mas o que acham os personagens mais diretamente envolvidos nisto? Veja o que diz Valadares: “Tudo isso não passa de especulação, porque o meu relacionamento com o Governo e com o governador Marcelo Déda é respeitoso e de comprometimento. O PSB faz parte da base do Governo e se não estivéssemos contentes com ele a primeira coisa que eu recomendaria aos nossos filiados seria que deixassem a administração de Déda. Nunca conversei nada com João Alves sobre este assunto. Quando nos cruzemos nos corredores do Senado, que ele frequenta muito, ele sempre fala comigo brincando sobre a possibilidade de eu estar ao seu lado”, diz o senador. Mas será que Valadares se sente tentado? “Eu não sou um homem de duas conversas. O nosso caminho é ao lado do projeto que ajudamos a construir desde 1994. Nosso principal objetivo hoje é a reeleição de Déda e do seu vice. Diferente de muita gente que agora está querendo falar alto, mas que chegou recentemente”.
Como ‘pretenso aliciador’ – num bom sentido – João Alves joga charme de generoso, mas não confirma qualquer entendimento: “Ora, se Valadares quiser vir pro nosso bloco não precisa nem me consultar – ele não é meu liderado. Basta só dizer. Todo mundo no DEM tem afeição por ele. Valadares é da casa. Mas ele não está tendo encontros reservados comigo. Eu apenas brinco com ele, num espírito de fraternidade. Digo a ele que ele é um peixe fora d’água (no grupo do PT). É um homem de paz, de diálogo. Só se eu fosse doido para não querer Valadares do meu lado. É um homem de valor, que tem liderança de verdade, tem voto, tem prestígio e não é como o Governo de Déda, odiento. Não embarcou na quebra de uma tradição que os petistas conseguiram, que é de se brigar internamente, mas não conspirar lá fora contra os interesses do Estado. Há 60 anos isto imperou em Sergipe, mas o Governo de Déda quebrou. O temperamento de Valadares é do bem, não é do mal”, diz João.
“Valadares é um amigo de décadas. Não é homem de explosão. Nunca tivemos desavenças. Tivemos discordâncias políticas, mas o considero um amigo civilizado e até fraterno. Valadares é um homem que vai às campanhas contra mim, nunca me detratou e eu nunca o detratei. Eu brinco com ele: no casamento da filha de Machado nos encontramos, eu brinquei lhe dizendo que o nosso casamento deveria também ser feito. Nós dois temos intimidade, mas nunca fizemos tratativas de acordo eleitoral para 2010. Eu lhe digo: ‘rapaz, você do lado de cá faz mais sentido, está no seu ambiente, é mais fácil de se reeleger. E ele ri”, revela o ex-governador.
Mas e Marcelo Déda, que parece o alvo de toda esta botaria, o que acha? “Vejo tudo isto como uma ficção fantástica. Vejo como consequência de uma oposição que está com problemas, que sofre esvaziamento e que tem dificuldades até de montar uma chapa majoritária forte e competitiva. Eles estão percebendo que não se faz uma chapa majoritária apenas com um candidato a governador, que eles têm e que é forte – não posso negar. São necessários um candidato a vice e dois a senadores. Neste sentido, nosso momento é muito feliz. Temos bons nomes para fazer até duas chapas majoritárias. O outro não tem como fazer uma”, diz Déda.
Por esta lógica, Déda aponta que tem de se encarar ‘com naturalidade’ que seus oponentes avancem sobre seu grupo e tentem tirar dele o máximo de lideranças e proveito – nem que seja espalhando boatos improcedentes. “A minha observação é a seguinte: eles querem transformar a nossa abundância de nomes em problemas, e o problema deles numa abundância. Querem inverter a ordem das coisas. Mas há de se compreender isto. Nós é que temos de apresentar sensibilidade, maturidade, força de vontade e espírito público para administrar estrategicamente esta nossa vantagem. Mas está óbvio que é melhor ter o problema do excesso do que o da escassez de quadros”, diz Déda. Será que os argumentos dos três garantem as alianças em 2010 como estão hoje? Só repetindo: a política é uma atividade que sabe injetar boatos e esperar para ver aonde eles vão dar.
Fonte: Cinform - Jozailto Lima
|