Ministro minimiza crise e afirma que fisco funciona normalmente
O ministro Guido Mantega (Fazenda) declarou que é uma "balela" dizer que o governo recuou na fiscalização dos grandes contribuintes. Essa foi uma das justificativas para a rebelião na Receita Federal. Integrantes da cúpula também falaram em interferência política. A mudança no foco dos auditores era também uma das bandeiras da ex-secretária da Receita Lina Vieira. Mantega minimizou a crise ao dizer que o fisco funciona normalmente mesmo com o pedido de demissão de cerca de 60 servidores e que trocas são normais. "Está se criando a ideia falsa de que há confusão", disse ele, que acrescentou que nada mudou nas prioridades de fiscalização. Apesar do discurso, Mantega foi repreendido pelo presidente Lula, que o responsabilizou diretamente pela rebelião no órgão. Para Lula, Mantega errou ao demitir Lina sem ter um substituto imediato. O vácuo de poder teria permitido a contestação ao governo. O presidente determinou que o ministro retome o controle do fisco rapidamente e evite "bate-boca" com a ex-secretária.
Lula repreende Mantega e exige "retomada" da Receita
Presidente diz que crise permitiu a funcionários contestarem autoridade do governo
Após falar com Lula, ministro minimiza crise e diz que nada mudou na fiscalização; "Está se criando a ideia falsa de que há confusão", diz Mantega
FOLHA DE SÃO PAULO
KENNEDY ALENCAR
LEANDRA PERES
VALDO CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu uma bronca ontem no ministro da Fazenda, Guido Mantega, responsabilizando-o pela rebelião na Receita Federal. Determinou que retomasse o controle do órgão rapidamente e evitasse "bate-boca" com a ex-secretária da Receita Lina Vieira. O presidente disse a Mantega que ele errou ao demitir Lina sem ter um nome para substituí-la de imediato. Na visão do presidente, o vácuo de poder na Receita permitiu que funcionários ligados a Lina e que ocupavam funções de segundo escalão no órgão contestassem a autoridade do governo.
Nas palavras de um auxiliar direto de Lula, Mantega deixou a tropa sem comando e aumentou a mágoa de Lina, surpreendida pela demissão em julho. Para o presidente, a inabilidade de Mantega resultou numa vingança contra o governo.
Essa vingança, no entender presidencial, foi a entrevista da ex-secretária à Folha na qual ela disse que a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, pediu a ela que apressasse as investigações da Receita sobre as empresas da família do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Potencial candidata do PT ao Palácio do Planalto em 2010, Dilma nega o encontro e o pedido.
Desde que Lina foi demitida, os superintendentes e principais dirigentes da Receita ameaçam sai. Num primeiro momento, afirmaram que iriam sair se o futuro secretário fosse ligado a gestões anteriores. Com a nomeação de Otacílio Cartaxo, que era sub de Lina Vieira, o governo achou que contornaria a oposição.
Mas o depoimento de Cartaxo à CPI da Petrobras dando respaldo à mudança na regra contábil que permitiu à estatal deixar de pagar R$ 2,1 bilhões em impostos reacendeu a disputa interna.
Essa semana, cerca de 60 servidores pediram demissão de seus cargos. Doze integrantes da cúpula da Receita assinaram manifesto falando em interferência política, abrindo uma crise sem precedentes na história do fisco.
Lula deu ordem a Mantega para dar sequência ao processo de mudanças no comando do órgão e, com isso, tentar restaurar o clima de "normalidade". Para Lula, alimentar a crise com Lina traz o risco de aumentar ainda mais o que ele chamou de "vitimização" da ex-secretária da Receita.
Depois da reunião com Lula, Mantega minimizou a crise. "A Receita está funcionando normalmente. Está se criando a ideia falsa de que há confusão", disse. Ele afirmou que nada mudou nas prioridades de fiscalização do órgão. Lina Vieira cita entre as realizações de sua gestão uma mudança no foco das auditorias.
O aumento na fiscalização de grandes contribuintes teria causado incômodo e seria um dos motivos de seu afastamento do cargo.
"É uma balela dizer que não estamos fiscalizando os grandes contribuintes. Há mais de dez anos existe um programa, que foi reforçado no meu comando", disse o ministro.
Mantega negou também que haja uma paralisação das atividades do órgão por causa dessas mudanças de pessoal. Segundo ele, é normal que o novo secretário da Receita, Otacílio Cartaxo, realize trocas. De acordo com o ministro, os demissionários são pessoas que já seriam mesmo afastadas.
Um assessor de Mantega disse à Folha que o ministro não está interessado em ficar "desmontando a administração de Lina" publicamente, pois teme um aprofundamento da crise.
A base governista derrubou ontem a tentativa da oposição de manter a crise na Receita na pauta do Congresso. Por votação simbólica, derrubou na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle o requerimento para o depoimento de Iraneth Dias Weiler, chefe de gabinete de Lina Vieira que, em entrevista à Folha, havia confirmado a versão dela sobre o encontro com Dilma.
Colaboraram EDUARDO CUCOLO e MARIA CLARA CABRAL , da Sucursal de Brasília