Nos últimos dois anos, a verba autorizada no Orçamento Geral do Estado (OGE) destinada diretamente à infância e à juventude foi de R$ 125.018.484,00. O montante representa menos de 2% do OGE para os anos de 2008 e 2009, um índice bem abaixo da média do país (16%) e menor ainda se equiparar à média da região Sul (22%). Para representantes dos conselhos estadual e municipal da Infância e Juventude, esses índices demonstram a falta de prioridade do governo para investir em ações voltadas para a criança e adolescente.
Se o valor destinado à área é pequeno, menor ainda é o valor efetivamente aplicado. Segundo dados do Investimento Criança (IC) de 26 de junho, repassados pelo Instituto Recriando, foram aplicados até aquela data 43,3% (R$ 53.708.370,82) do total autorizado. Usando outros dados – do relatório do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), sobre a execução da Lei Orçamentária Anual (LOA) –, dos R$ 38 milhões autorizados para a infância este ano, foram aplicados até o dia 27 de junho R$ 16 milhões. O Inesc promove debates e índices relacionados a orçamentos e direitos humanos (ver boxe sobre as duas metodologias de cálculo). Em ambos os casos, a efetivação é menos da metade do valor orçado.
Sem políticas
Segundo o IBGE, 40,27% da população de Sergipe é formada por pessoas com menos de 18 anos. Para o presidente do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (CEDCA), o advogado Thiago Oliveira, destinar R$ 125 milhões de um orçamento de R$ 9,5 bilhões é muito pouco. “Não existe uma política pública para a criança e para o adolescente. Não há uma política de drogatização, não há espaço para elas. Se uma criança sofre abuso sexual, muitas vezes tem que agendar o exame para cinco ou seis dias depois. E os vestígios, como serão recolhidos?”, questionou.
No início deste ano, duas meninas, de 11 e 13 anos, foram levadas por um taxista a um motel no bairro Santa Maria. A polícia flagrou o indivíduo, que está preso no Complexo Penitenciário Manoel Carvalho Neto (Compecan), em São Cristóvão. As garotas foram levadas pelo Conselho Tutelar da área do Santa Maria, mas só ficaram sob às vistas dos conselheiros por poucos dias. Três meses depois, o JORNAL DA CIDADE flagrou uma delas, a mais velha, perambulando pelo bairro com roupas sumárias.
Nos cruzamentos da cidade, entre um sinal vermelho e outro, crianças e adolescentes limpam pára-brisas, vendem balas e algumas até seus corpos, distantes de ações e programas de governo (ver boxe). Nas portas de supermercados e nas imediações de feiras livres, outras dezenas trocaram os carrinhos de brinquedo por carrinhos de mão pesados de compras de pessoas que dão alguns trocados pelo serviço ilegal. Em Sergipe, são 58 mil jovens com idades entre 10 a 17 anos que exercem algum tipo de trabalho, remunerado ou não, mas que, em qualquer uma das duas situações, é infração de lei.
Aniversário do ECA
Semana passada, o Estatuto da Criança e do Adolescente completou 19 anos. Na avaliação de Thiago Oliveira, muitos avanços foram conquistados ao longo dessas quase duas décadas de existência, mas ainda há muito que se caminhar em busca de dignidade para a infância e adolescência.
Mais transparência e prioridades na questão orçamentária é um desses passos em que é preciso acelerar. “Penso que falta ainda dar mais transparência na utilização dos recursos. É preciso também ampliar a destinação de verbas para a área e que não seja contingenciada. O que se destina já é pouco e ainda é contingenciada, daí torna-se menor ainda”, falou.
Ele lembrou que, baseado na Constituição Federal e no ECA, a verba para a infância e a juventude não pode ser contingenciada, pois as duas legislações estabelecem a infância e juventude como prioridades da Nação. “Mas o que vemos na prática é que o governo está destinando esses recursos para outras áreas ou para fazer reservas. Infelizmente, não existe na nossa legislação algo que possa pressionar com mais força o governo para que use a verba da infância, para essa área, pois a lógica do orçamento é que ele é autorizativo e não impositivo, portanto, é uma decisão política de governo e quem decide o que vai fazer com o dinheiro é o chefe do Executivo e o que nós vemos é que não há prioridade na área da infância e juventude”, falou.
Simplificar orçamento
O vice-presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA), Gean Santos, destacou a importância de simplificar o orçamento a fim de que possa ser acompanhado mais facilmente pelo cidadão. “Acompanhar a aplicação dos recursos no orçamento é um desafio”, disse. Segundo ele, a dificuldade está não só em conseguir entender e acompanhar as aplicações, mas até mesmo, também, pelos percalços para se conseguir ter acesso a ele. Assim como o CEDCA, o Conselho Municipal também precisou recorrer ao Ministério Público Estadual para conseguir ter uma cópia do orçamento em mãos.
Para a primeira das dificuldades – a da compreensão – representantes do Fórum de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (FDDCA) e dos conselhos participaram em 2007 de um curso promovido pelo Fórum Nacional DCA em conjunto com entidades que atuam na área do orçamento público (o Inesc foi um deles). Thiago Oliveira e Gean Santos participaram.
Investimento Criança
No ano passado, o termo Orçamento Criança (OC) foi substituído por Investimento Criança (IC). O Unicef considera que o Investimento Criança é formado por investimento ou gasto específico em programas e iniciativas dirigidos especificamente a crianças e adolescentes e pelo gasto indireto ou investimento que beneficia predominantemente a esse público a partir de programas e iniciativas dirigidos à família e/ou outros agentes, como o Bolsa Família, e que proporcionem bem-estar a crianças e adolescentes.
Programas desenvolvidos
Segundo o Departamento de Assistência Social da Secretaria de Estado da Inclusão, Assistência e do Desenvolvimento Social (Seides), o Estado coordena programas de atenção a crianças e adolescentes que são executados pelos municípios. Esses programas se dividem em proteção social básica e a especial.
Entre os programas ProJovem Adolescente, Peti e abrigos, são atendidas 37.500 crianças. Existem ainda cerca de três mil assistidas pelo Departamento de Inclusão Produtiva, através dos nove Espaços de Convivência Comunitária (ECCO’s) também da Seides. De acordo com a chefe desse departamento, Eleonora da Graça, nesses locais a juventude tem atividades de arte e educação e reforço pedagógico (banca escolar).
Os programas coordenados pela Seides são: ProJovem Adolescente; Benefício da Prestação Continuada, que consiste em uma espécie de aposentadoria por idade ou incapacidade produtiva para aqueles cuja renda per capita familiar seja inferior a ¼ do salário mínimo; Peti; Serviços de Enfrentamento à Violência, Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes e suas famílias; Serviço de Orientação e acompanhamento a Adolescentes em Cumprimento de Medidas Sócioeducativas em Meio Aberto (Liberdade Assistida e Prestação de Serviço a Comunidade); e os abrigos.
O Projovem atende atualmente 6.300 adolescentes entre 15 a 17 anos pertencentes ao Bolsa Família e egressos do Peti. Já o Peti atende 30.875 crianças e adolescentes. Nos abrigos estão 474 jovens.
Fonte: Jornal da Cidade
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