...Só o estado de Sergipe, com um terço da área desse bolsão de pobreza, terá direito a R$ 7 bilhões. O Correio visitou municípios que fazem parte da Chapada do Araripe e de Xingó. A miséria assusta. Ali, metade da população vive do Bolsa Família. Famílias têm renda mensal de R$ 150. Há necessidade de estradas, irrigação, água tratada, esgoto...
A colonização dividiu o Brasil em dois. De um lado, o litorâneo, desenvolvido, destino dos pesados investimentos nacionais. De outro, o pobre, atrasado, carente de políticas públicas. Trata-se da Belíndia, na feliz definição de Edmar Bacha em 1974 — parte Bélgica, parte Índia. Longe de diminuir com o passar dos tempos, a dicotomia se agrava. Existe um Brasil encravado na região mais pobre do país, o Nordeste, mas é mais miserável do que ela. Ali falta tudo: água, comida, trabalho, dignidade. Trata-se dos sertões, áreas distantes das capitais e da prioridade do Estado.
Segundo definição do próprio governo, as regiões esquecidas são o resultado do processo de desenvolvimento caracterizado pela concentração no Centro-Sul e nas faixas litorâneas, conhecido por civilização caranguejo. Apesar dos avanços no esforço de desconcentração, o país ainda “sente falta de políticas públicas que contribuam para a inserção igualitária dessas áreas”, reconhece o ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima.
O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o de maior orçamento e apelo eleitoral do governo Lula, seria oportunidade para resgatar a dívida do Brasil mais rico com a sua porção mais pobre. Levantamento do Correio mostra, porém, que a histórica concentração de riquezas se mantém. Os projetos de maior vulto continuam no litoral. As mesorregiões, formadas por pedaços de dois, três e até quatro estados, ficam com a menor fatia do bolo orçamentário.
A região de Xingó, por exemplo, que reúne os sertões de Alagoas, Sergipe, Bahia e Pernambuco, receberá R$ 1,8 bilhão em investimentos do PAC. Só o estado de Sergipe, com um terço da área desse bolsão de pobreza, terá direito a R$ 7 bilhões. O Correio visitou municípios que fazem parte da Chapada do Araripe e de Xingó. A miséria assusta. Ali, metade da população vive do Bolsa Família. Famílias têm renda mensal de R$ 150. Há necessidade de estradas, irrigação, água tratada, esgoto.
Ninguém ignora que obras de grande porte do PAC passam por ali. É o caso da Ferrovia Transnordestina e a Transposição do Rio São Francisco. Mas estão em ritmo lento. A Transnordestina vai inaugurar o primeiro trecho, de 96km, na metade do sétimo ano do governo Lula. Falta muito. Nada menos de 1,6 mil quilômetros esperam ser concluídos em um ano e meio. A Transposição do Rio São Francisco tem orçamento de R$ 4,8 bilhões. Mas, de janeiro de 2007 a abril deste ano, R$ 588 milhões foram liberados.
No Canal do Sertão Alagoano, o governo quer investir R$ 593 milhões até o fim de 2010. Nos últimos três anos, porém, aplicou apenas R$ 96 milhões na obra, que está parada por causa de fraudes apontadas pelo Tribunal de Contas da União. O quadro desolador autoriza a conclusão: sem mudanças estruturais, as regiões que pedem socorro afundarão cada vez mais na pobreza. Como efeito colateral, contribuirão para inchar os centros urbanos.
CORREIO BRASILIENSE