Grupo do presidente ainda espera aval para eleger Gilberto Carvalho, mas José EDUARDO DUTRA já é alternativa
Sobrevivente de uma sucessão de crises que dizimaram o núcleo duro do governo, o antigo Campo Majoritário do PT ainda aguarda o sinal verde do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para lançar a candidatura do chefe de gabinete Gilberto Carvalho ao comando do partido. O problema é que Lula resiste ao pedido, aumentando o racha na seara petista. Enquanto o grupo do presidente prega a união em torno do nome apoiado pelo governo, sob o argumento de que o favorito precisa do passaporte para coordenar a campanha da ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) ao Planalto, em 2010, outras alas criticam a síndrome da dependência de Lula.
Com receio de que o chefe não dê aval para Carvalho deixar o gabinete, dirigentes do PT começaram a sondar para o cargo o presidente da BR Distribuidora, José EDUARDO DUTRA. "Eu sou o legítimo plano B", brincou DUTRA, que é ex-senador. "Estou muito satisfeito na minha atual função, mas disse aos companheiros que, se Gilberto não puder ser candidato e eu puder agregar, estou à disposição."
A eleição que definirá a direção do PT está marcada para novembro, com voto dos filiados, mas o prazo para inscrição das chapas termina em 25 de julho. Lula chegou a afirmar que Carvalho não pode ser presidente do PT porque "não tem perfil" para o posto, considerado um "abacaxi" até pelo Planalto. "O presidente acha que é preciso alguém com mais visibilidade para articular as alianças", contou o auxiliar.
Na avaliação de Lula, é imprescindível que o escalado tenha mão de ferro para pacificar a guerra de facções no PT e vista o figurino da conciliação quando for negociar as parcerias com o PMDB. Seria, no seu diagnóstico, uma mistura do ex-ministro José Dirceu - abatido pelo escândalo do mensalão, em 2005 - com o assessor especial para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia.
"Gilbertinho não dá para isso. Ele é um homem bom", disse Lula. Ministros garantem que o presidente não vai aprovar a saída do chefe de gabinete porque ele é seu braço direito. Deputados e secretários do PT, porém, têm certeza de que Carvalho será o candidato da corrente Construindo um Novo Brasil (CNB), como foi rebatizado o Campo Majoritário.
BÍBLIA
O hábito do presidente de esgotar todos os prazos antes de tomar decisões fez surgir nos bastidores do PT uma máxima: "Lula é como a Bíblia: cada um lê e interpreta como quer". Diante do impasse, parlamentares da tendência CNB e de grupos que giram como satélites em torno dela iniciaram um movimento para apaziguar a luta interna e atrair o apoio a Dilma.
"Há um vácuo de poder no partido", admitiu o deputado Devanir Ribeiro (SP), que no passado defendeu o terceiro mandato para Lula, mas recuou. "Lula é o presidente de fato do PT, é ele que tem a tropa. Aí ninguém quer ser candidato porque o cara pensa assim: ?Por que eu vou ser uma rainha da Inglaterra?? ??
Para Valter Pomar, secretário de Relações Internacionais do PT, o antigo Campo Majoritário é hoje um guarda-chuva que abriga subgrupos e está unido "apenas na forma, não no conteúdo". Dirigente da Articulação de Esquerda, Pomar diz que o grupo de Lula quer "constranger" as outras correntes a não disputar a eleição no PT, mesmo sem discutir a plataforma para o próximo período.
"Que diabo de unidade é essa?", provocou Pomar. "Não temos problemas com Gilberto, mas o argumento de que ele é um bom nome para presidir o PT porque tem forte laço com Lula passa a ideia de que o partido precisa ser uma repartição. Então vamos ter uma extensão do Lula?"
Embora o presidente tenha se distanciado da direção do PT, sua palavra tem sempre o peso do enquadramento. Na primeira eleição ao Planalto sem Lula na chapa - e com uma pré-candidata como Dilma, sem familiaridade com o jogo petista -, a cúpula do PT tenta agora segurar seus candidatos a governador para que não entrem no páreo antes da negociação com o PMDB. Impensável nos tempos de oposição, a ordem do Planalto é deixar o PT em segundo plano nos Estados onde o PMDB tiver nomes de peso.
Numa reunião realizada em abril, a própria Dilma cobrou da direção do PT, em tom duro, mais agilidade na montagem dos palanques. "Há um processo de peemedebização do PT, hoje prisioneiro do carisma do Lula", alfinetou o deputado Chico Alencar (RJ), que trocou a sigla pelo PSOL em 2005, no auge da crise do mensalão.
HIPOCRISIA
Com números favoráveis na ponta da língua, o presidente do PT, deputado Ricardo Berzoini (SP), lembra que o partido obteve 29% da preferência do eleitorado, bem à frente do PMDB, com 8%, e do PSDB, com 7%, segundo a última pesquisa do instituto Vox Populi.
"Seria hipocrisia não levar em conta a opinião de Lula, mas isso não quer dizer que ela sempre prevaleça", insistiu Berzoini. "Não se trata de síndrome da dependência, mas de um espaço político ocupado por um líder de massa que construiu o PT", emendou o secretário-geral do partido, José EDUARDO Martins Cardozo (SP).
Do grupo Mensagem ao Partido, Cardozo preparou o Código de Ética, que ressuscita o plano de criar no PT uma Corregedoria, chamada agora de Conselho de Assuntos Disciplinares. Além disso, obriga candidatos petistas a renunciar ao sigilo fiscal, bancário e telefônico quando forem alvo de denúncias. O código ainda não foi votado, mas o deputado quer transformá-lo no carro-chefe de sua campanha, caso seja candidato à presidência do PT.
Ao contrário da Articulação de Esquerda, que promete lançar a deputada Iriny Lopes (ES) à vaga de Berzoini, Cardozo garante que não enfrentará Carvalho, mas está disposto a concorrer se o nome apoiado pelo Planalto for DUTRA. O grupo de Cardozo é capitaneado pelo ministro da Justiça, Tarso Genro, desafeto de Dirceu.
No mosaico ideológico do PT o consenso parece impossível. Fiel da balança na última eleição interna, em 2007, o Movimento PT - integrado pelo ex-presidente da Câmara Arlindo Chinaglia - também pretende disputar o comando partidário com a deputada Maria do Rosário (RS). Mesmo em fogo brando, o caldeirão petista ferve.
O ESTADO DE SÃO PAULO - Vera Rosa