MP pode pedir ao Estado fornecimento de remédios para cidadãos necessitados
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) reafirmou, na tarde desta terça-feira (26), a legitimidade ativa do Ministério Público para propor ação civil pública em favor de determinados cidadãos que necessitam do fornecimento de remédios por parte do Estado. A decisao foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 407902, ajuizado contra decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), que extinguiu um processo sem julgamento de mérito, alegando que não caberia ao MP atuar em favor da senhora que necessitava de fornecimento gratuito de remédios.
O MP ajuizou a ação em favor da viúva no TJ-RS, alegando que o direito à vida de pessoa com 66 anos de idade, com insuficiência renal crônica, anemia e cardiopatia isquêmica, necessitando urgentemente do fornecimento de remédios pelo Estado, estaria incluído no rol de suas competências, previstas no artigo 129, inciso II, da Constituição Federal.
Em seu voto, o ministro Março Aurélio citou três dispositivos constitucionais para embasar o entendimento de que o MP pode atuar nesses casos. Inicialmente, o ministro lembrou que o artigo 127 da Constituição diz que cabe ao MP a defesa dos interesses sociais e individuais indisponíveis. E que o artigo 196, também da Carta Magna, diz que a saúde é direito de todos e dever do Estado.
Por fim, o ministro ressaltou que o artigo 129, II, mencionado pelo MP, prevê como função institucional do Ministério Público "zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias à sua garantia".
Por unanimidade, os ministros decidiram afastar a extinção do processo, determinando o retorno dos autos para que o TJ-RS prossiga no exame do caso.
NOTAS DA REDAÇÃO
A ação civil pública é demanda de origem coletiva, constitucionalmente prevista no artigo 129, III que atribui ao Ministério Público a incumbência de "promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos".
Veja-se que a Carta Magna menciona a defesa dos interesses difusos e coletivos. De acordo com Código de Defesa do Consumidor (art. 81, parágrafo único), "os interesses difusos são os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato"; já os interesses coletivos são "os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base".
Neste sentido e num primeiro momento, a possibilidade de o membro do Ministério Público ajuizar ação civil pública em favor de apenas uma pessoa, a fim de lhe tutelar o direito de receber do Estado medicamentos, poderia parecer contrário ao legalmente previsto, já que a idéia parece não estar de acordo com os preceitos coletivos.
Por outro lado, a Constituição Federal prevê no artigo 129, inciso II ser função institucional do MP "zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia".
Não foi outro o entendimento da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal ao entender que a prestação por parte Estado de produtos medicamentosos a pessoa impossibilitada de obtê-los por meios próprios é um serviço de relevância pública ao direito constitucionalmente assegurado da saúde, pois assim dispõe o artigo 196: A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação .
Assim, o entendimento exposto na notícia supra colacionada vem legitimar o Ministério Público a propor ação civil pública para tutelar o direito social à saúde, no sentido de pleitear a concessão de medicamentos por parte do Estado.
Autor: Áurea Maria Ferraz de Sousa
Fonte: JusBrasil
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